Disco: “Sonhando Devagar”, Kassin

/ Por: Cleber Facchi 06/08/2011

Kassin
Brazilian/Experimental/Alternative
http://www.coqueiroverderecords.com/kassin/

 

Por: Cleber Facchi

Não importa a direção que você olhe, em todo horizonte da boa música produzida em território nacional a figura de Alexandre Kamal Kassin estará lá, inventando, se intrometendo e deixando mesmo que involuntariamente sua marca. Desde que a homônima estreia do conjunto carioca Acabou La Tequila tomou formas em meados da década de 1990, que o cantor, compositor e produtor carioca passou a se manifestar ativamente em boa parte das produções geradas em solo tupiniquim, entretanto, estranho que em quase duas décadas de atividades só agora Kassin lance seu “primeiro” disco em carreira solo.

Embora Sonhando Devagar (2011, Coqueiro Verde) surja como o primo registro do produtor a levar seu nome de forma única, esta não é a primeira vez que o carioca se aventura na criação de um projeto de forma individual. Em meio a produção do quarto disco do Los Hermanos em 2005, o músico envolto através do nome de Artificial lançou o experimental registro Free U.S.A., trabalho construído a partir do uso de emulações eletrônicas e sons captados a partir de um Game Boy. Mesmo ao lado dos parceiros Moreno Veloso e Domenico Lancelloti através do projeto +2, Kassin também deu formas ao elogiado Futurismo, outro disco que de uma forma ou outra poderia ser compreendido como seu.

Onírico e tomado de sonorizações peculiares é Sonhando Devagar o primeiro trabalho em que Kassin parece decidir solitário todos os rumos e conduções a serem tomadas em um registro, algo que assim como o esperado se traduz em um claro acerto. Costurando doses de samba, jazz, música pop, experimentações eletrônicas e um leve tempero de excentricidade, o disco só parece possível em virtude de alguma rachadura no vasto universo que se abriga na cabeça do carioca, surgindo como uma espécie de continuação daquilo que o músico desenvolveu em 2006 ao lado dos parceiros Veloso e Lancelloti.

Por mais que algumas composições venham embaladas em um rótulo essencialmente pop e radiofônico, não espere se deparar com faixas que fluam dentro da mesma linguagem que movimenta grande parte da música nacional. O toque melódico e o becking vocal que acompanham Fora de Área, por exemplo, parecem se agrupar em uma composição acessível, mas que em diversos momentos alteram seu fluxo e bebericam referências de distintos setores da música, indo desde o pop dos anos 60 até emanações da década de 1970, isso enquanto uma camada de limpidez aproxima a canção do que há de mais moderno na música alternativa atual.

Até quando se aventura pelos ritmos puramente nacionais, como o samba em O Que Você Quiser ou o technobrega em Sorver-te, Kassin faz disso uma possibilidade em perverter lógicas e misturar o máximo possível de elementos dentro de uma única canção. Nessa segunda, por exemplo, o carioca atravessa desde as trilhas sonoras de jogos videogames clássicos da década de 90 (um Alex Kidd ou um Golden Axe talvez) até o sytnhpop oitentista, tudo isso enquanto cruza tudo com um ritmo específico dos sons nortistas. O contrário do que poderia parecer, esse jogo de inúmeros cruzamentos resulta em algo que passa longe de soar exagerado, como se o produtor soubesse o tempo todo qual é seu limite.

Diferente das anteriores empreitadas do músico na produção de algo que fosse esclarecido como seu, Sonhando Devagar é um disco que mantém o tempo todo a busca por um tipo de som ameno, distante das guitarras (sempre posicionadas ao fundo das músicas) e em certos momentos bastante climático. Nada de composições calorosas aos moldes de Água, Pra lembrar ou Samba machine, algumas das entusiasmadas faixas que tomaram conta do último registro do músico. Por mais que canções como Lin Quer, Quando Você Está Sambando e Calça de Ginástica (que se fosse lançada na década de 1980 se transformaria em um clássico imediato) até tragam uma formatação mais empolgada (e bem humorada) ao disco, o trabalho segue o tempo todo em uma continuidade abrandada, o que talvez até explique seu título.

Mesmo que seja concebido como o primeiro trabalho solo de Kassin, sendo ele o responsável por todas as decisões que constroem o álbum, cada uma das dez faixas do disco chegam acompanhadas de um vasto número de instrumentistas e colaboradores, afastando o caráter solitário do disco. Ao lado de nomes como Stephane San Juan, Chiara Banfi, Donatinho, Gabriel Muzak e Marlon Sete, o registro vai lentamente sendo delineado. Até os antigos parceiros do Domenico e Moreno se encontram na faixa Em Volta de Você, puxando o álbum mesmo que por alguns segundos para junto do encontro gerado pelo +2.

Contando com um encarte montado a partir de imagens em 3D e lançado pela Coqueiro Verde (mesma gravadora escolhida pelo parceiro Domenico para o lançamento de Cine Privê) Sonhando Devagar  surge para comprovar aquilo que muitos talvez já saibam: a insanidade e a genialidade de Kassin. Por mais que o ouvinte busque de alguma forma encontrar algum ponto de apoio dentro do disco é simplesmente impossível prever o que virá na sequência, já que as canções cada vez mais nos puxam para dentro da estranha realidade que vai se desenrolando pelo disco, fazendo o ouvinte se questionar qual seria a realidade correta, a dele ou a do álbum?

 

Sonhando Devagar (2011, Coqueiro Verde)

 

Nota: 8.6
Para quem gosta de: Domenico Lancellotti, Cidadão Instigado e Wado
Ouça: Calça de Ginástica, Fora de Área e Sorver-Te

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.