Disco: “St. Vincent”, St. Vincent

/ Por: Cleber Facchi 25/02/2014

St. Vincent
Indie Rock/Alternative/Female Vocalists
http://ilovestvincent.com/

Por: Cleber Facchi

St Vincent

Existe uma distancia imensa entre Merry Me, álbum de estreia de Annie Erin Clark com o St. Vincent, do autointitulado quarto disco de estúdio da cantora. Enquanto o registro lançado em julho de 2007 entrega ao público uma atmosfera de plena timidez e aparente descoberta, como se cada acorde fosse manuseada de forma sutil, com o presente álbum a imponência da norte-americana se manifesta como um ponto chave para a comunicação com o público. Outrora “inofensiva”, Clark rompe de vez com qualquer limitação estética, ultrapassando a película bem retratada na capa de Strange Mercy, de 2011, para assumir um posto isolado de liderança dentro do atual “império” do rock alternativo.

Como uma diva imponente que observa sem grande importância a massa de seguidores, a cantora estampa a capa do disco em uma autêntica representação da grandeza que orquestra os sons de todo o trabalho. Em um evidente sentido de continuidade ao que foi lançado há três anos, cada música do presente álbum arrasta o espectador para um território em que ruídos servem como alicerce preciso para a formação do todo. É como se todo o segundo ato de Northern Lights, faixa mais intensa do disco anterior, fosse repetido de forma exaustiva, uma comunhão de arranjos tortos que aparecem na inaugural Rattlesnake e seguem até o fechamento, com a melancólica Severed Crossed Fingers.

Mais do que uma evidente aproximação com o disco de 2011, com o presente álbum, St. Vincent entrega ao público toda a coletânea de referências acumuladas no decorrer dos últimos anos. Enquanto Digital Witness cresce como um resumo inteligente do que foi Love This Giant, trabalho de 2012 lançado em parceria com David Byrne (ex-Talking Heads), Birth in Reverse e Regret são típicas extensões do cenário construído nos singles paralelos da banda. É como se toda a versatilidade e crueza da faixa Krokodil, feita especialmente para o Record Store Day de 2012, fosse aplicado dentro do contexto do novo álbum.

Ao mesmo tempo em que se fecha dentro de um universo particular e delimitado pelo título óbvio de “St. Vincent”, o novo disco talvez seja a melhor representação de Annie Clark quanto personagem e não pessoa. “Oh, que dia normal/ Levar o lixo para fora, se masturbar/ Eu ainda estou segurando o riso… Aqui está o meu relatório do infinito”, entrega em meio aos acordes efêmeros de Birth In Reverse, faixa que apresenta a artista como um ser quase robótico e de atos pontualmente delimitados. Curioso observar o quanto essa postura serve de contraste ao cenário exposto em Actor, de 2009, obra em que a Clark se protege como um personagem, mas na verdade expõe de forma honesta os próprios sentimentos e impressões.

Claro que a imposição da cantora quanto “atriz” – ou “rainha” de um universo paralelo, como a capa do disco bem representa – não oculta a formação de versos essencialmente honestos e confessionais. Basta um mergulho na construção macambúzia de Severed Crossed Fingers (“Eu tenho esperança, mas a minha esperança não está ajudando você”), ou na paixão explícita de Regret (“Eu tenho medo de você porque eu não posso ficar para trás”) para perceber o quanto a artista surge frágil, naturalmente humana. O mais interessante talvez seja perceber o grau melódico encontrado por Clark para a formação do disco, um aperfeiçoamento que se estende desde o debut até a máxima compreensão com o recente álbum.

Diferente da formação de Strange Mercy, em que o uso de metáforas – vide Cheerleader e Cruel – estimulavam e ao mesmo tempo retraíam a expansão do projeto, com o novo disco Clark parece livre para abraçar o grande público com dinamismo. São canções descomplicadas (Digital Witness), faixas que atendem aos velhos seguidores (Rattlesnake), ou mesmo músicas tomadas pela densidade dos atos (I Prefer Your Love). Um trabalho que reforça com evidencia a maturidade e o total domínio de Clark sob o St. Vincent, mas que ao mesmo tempo reforça o quanto a artista está apenas começando.

 

St. Vincent

St. Vincent (2014, 4AD)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: tUnE-yArDs, Fiona Apple e Bat For Lashes
Ouça: Digital Witness, Birth in Reverse e Severed Crossed Fingers

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.