Disco: “To the Happy Few”, Medicine

/ Por: Cleber Facchi 06/08/2013

Medicine
Shoegaze/Noise Pop/Alternative
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Por: Cleber Facchi

Medicine

Duas décadas de ruído marcam a trajetória e os rumos atuais do grupo norte-americano Medicine. Dona de pelo menos dois grandes clássicos do Shoegaze/Noise Pop lançados na década de 1990 – Shot Forth Self Living (1992) e The Buried Life (1993) -, a banda de Los Angeles, Califórnia volta à cena em um momento de plena atenção para o gênero e tudo o que foi conquistado há duas décadas. Aproveitando do revival 90’s que ocupa diferentes estágios da música, a banda comandada por Brad Laner faz do recente To the Happy Few (Captured Tracks, 2013) não apenas um regresso, mas uma completa incorporação de tudo o que foi conquistado no passado – sem qualquer distanciamento da presente cena.

Da primeira à última faixa, o novo álbum incorpora o que parecer ser um único propósito: brincar abertamente com os ruídos. Em um esforço temático que organiza o disco dentro de um mesmo universo – basicamente, o trabalho começa e termina dentro da mesma onda de distorção -, Laner parece continuar de onde parou há duas décadas, e não em 2003, com The Mechanical Forces of Love, último registro em estúdio do projeto. São as mesmas vozes submersas, batidas que parecem trilhar um percurso individual e todo um jogo de sons desconstruídos que contribuem para o ambiente caótico da obra. Desconstrução em prol da construção dos sons.

Ambientado em um universo muito próximo do exposto recentemente pelo My Bloody Valentine, em M B V (2013), To the Happy Few é um registro que brinca de forma espontânea com os contrastes. Enquanto as guitarras crescem em uma medida cada vez mais ruidosa, quase inaudível, as vozes tímidas tentam assumir um território específico, mínimo. Beth Thompson, que já havia trabalho com o grupo na década de 1990 e posteriormente foi substituída por Shannon Lee, é quem assume essa responsabilidade. Espécie de oposto natural aos sons intransponíveis que alimentam o disco, a cantora fomenta a atmosfera agridoce da obra, resultando no que parece ser uma versão noturna dos Beach Boys, um jogo de melodias temperadas pela sujeira.

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Capaz de alimentar um lado mais “pop” do trabalho, Laner parte em busca da própria essência em um exercício atento de filtrar experiências prévias. Resultado claro desse lado menos hermético e mais comercial da banda está em músicas como Burn It. Com uma levada carregada de descompromisso, a canção parece fugir à regra no que determina os rumos do presente disco. Um respiro em meio à onda crescente de distorções seguida até o fechamento do álbum. Surgem ainda outros instantes mais “acessíveis” pelo trabalho, caso de Butterfly’s Out Tonight, música que encontra no acréscimo de pianos, na bateria ativa de John Goodall e na voz presente de Thompson um ponto de novidade para a obra, quase próximo da psicodelia.

Mesmo que o disco pareça seguir dentro de uma medida semi-anárquica de sons e vozes, é preciso observar como cada instante da obra parece orquestrado em um cenário cuidadosamente delimitado. Resultado nítido disso está na forma como faixas mais leves fornecem uma espécie de respiro e ao mesmo tempo sustento para as canções mais experimentais. Uma sequência natural de altos e baixos temáticos sonoros, como se a banda fosse lentamente testando a reação do ouvinte. Dentro desse sentido, To the Happy Few  se apresenta como uma obra de atos, alguns nítidos – como em All You Need to Know e Find Me Always -, e outros dissolvidos pela obra, que mantém a unidade entre as faixas um exercício constante.

Longe de surgir como um dos lucrativos retornos musicais que marcaram o ano – até pelo fato de que a banda está longe de ser adorada por legiões -, To the Happy Few cresce como uma obra fundamental para a curta discografia do Medicine. Partindo do mesmo esforço corajoso que orienta The Buried Life – trabalho que permanece como o melhor registro do grupo -, o novo álbum se entrega aos experimentos e ainda assim parece atento às novas demandas do público, prova de que o tempo trouxe benefícios consideráveis ao trabalho do grupo. Brad Laner está de volta, e torçam para que não seja por pouco tempo.

Medicine

To the Happy Few (Captured Tracks, 2013)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: My Bloody Valentine, Chapterhouse e Deerhunter
Ouça: Butterfly’s Out Tonight, Long As The Sun e Burn It

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.