Disco: “Tomorrow’s Modern Boxes”, Thom Yorke

/ Por: Cleber Facchi 02/10/2014

Thom Yorke
Electronic/Alternative/Indie
https://twitter.com/thomyorke

Por: Cleber Facchi

Em algum momento dos anos 2000, Thom Yorke parece ter estacionado criativamente. A natureza mutável dos arranjos e versos explorados desde o começo da década de 1990, encontraram na série de obras pós-The Eraser (2006) uma evidente zona de conforto. Mesmo que In Rainbows (2007), sétimo disco do Radiohead, tenha mais uma vez balançado a cena musical – muito pela forma como foi lançado -, em se tratando da estrutura das canções, o músico britânico parece perdido em um loop criado por ele próprio. Um ruído sujo entre o universo imenso descoberto em Kid A (2000) e os beats matemáticos do primeiro álbum solo.

Em Tomorrow’s Modern Boxes (2014, Independente), segundo e mais recente trabalho em carreira solo, Yorke parece incapaz de ir além do mesmo resultado auto-imposto. Encaixes minimalistas, batidas assíncronas e tradicional voz subaquáticas. A mesma estratégia que inaugura que álbum solo de 2006, orienta a direção de The King Of Limbs (do Radiohead) em 2011 e parece sair de fábrica no ambiente previsível de AMOK (2013), estreia do Atoms For Peace – a nova banda velha do músico britânico.

Estranho que mesmo em um ambiente tão similar, Thom Yorke consiga parecer diferente com o novo álbum. Como uma versão abortada desse mesmo universo de batidas e vozes sempre precisas, o presente disco – obra lançada via torrent – convence pela imperfeição. Cortes bruscos, ausência de linearidade e completa instabilidade na formação dos sons. Se há 14 anos o cantor se transformou em instrumento para emular as vozes e harmonias que ocupam faixas como Everything In Its Right Place e Idioteque, hoje pouco disso parece ter sobrevivido. Tudo é som.

Tão subjetivo quanto o primeiro disco solo do cantor, TMB é uma obra que lida durante todo o tempo com a urgência. Ainda que ponderado em se tratando do uso das vozes e colisão dos temas instrumentais, basta a inaugural A Brain In A Bottle para perceber o terreno conturbado que o ouvinte enfrente ao longo da obra. É como se Yorke acordasse de um pesadelo e imediatamente finalizasse o disco, ainda sonolento, deixando evidente cada rachadura ou forma torta que preenche o material. Não existem respostas, apenas a necessidade transportar o ouvinte para o mesmo cenário onírico há pouco rompido.

Musicalmente curioso dentro dos limites do Radiohead ou do próprio campo solo do artista, o novo álbum talvez seja o trabalho em que Thom Yorke mais assume as próprias referências. Observado com atenção, TMB é mais do que um resumo “estranho” dos últimos projetos paralelos do cantor, mas um resgate expressivo dos recentes lançamentos de Four Tet, Burial e Flying Lotus – parceiros de longa data e algumas das principais influências do britânico. Variações das mesmas bases e batidas concebido em Cosmogramma (2010) e principalmente Pink (2012), trabalhos que parecem reciclados a cada curva, base ou mínima fagulha vocal do registro.

Mesmo acompanhado de perto pelo colaborador Nigel Godrich e cercado de referências (musicais) externas, Thom Yorke assume em Tomorrow’s Modern Boxes sua obra mais hermética, quase particular. Trata-se de uma representação dos sentimentos (Interference), referências (The Mother Lode) e principais acontecimentos que atravessam a vida recente do cantor (Truth Ray). Ruídos, massas instáveis de sons e vozes por vezes inaudíveis, mas que emulam com naturalidade um passeio instável pela mente do própria artista. Se há uma década o cantor encontrou conforto, talvez agora ele esteja próximo de abandonar esse cenário, mesmo sem sair de dentro dele.

 

Tomorrow’s Modern Boxes (2014, Independente)

Nota: 7.0
Para quem gosta de: Four Tet, Atoms For Peace e Flying Lotus
Ouça: The Mother Lode, Interference e There Is No Ice (For My Drink)

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.