Disco: “Trouble in Paradise”, La Roux

/ Por: Cleber Facchi 22/07/2014

La Roux
Electronic/Synthpop/Female Vocalists
http://www.laroux.co.uk/

Por: Cleber Facchi

La Roux

Elly Jackson não poderia ter assumido uma estratégia mais corajosa do que os quatro anos de hiato que antecedem Trouble in Paradise (2014, Polydor). Longe da euforia, sintetizadores chiclete e versos fáceis que se projetam de Bulletproof e I’m Not Your Toy – algumas das faixas mais comerciais do álbum de estreia, lançado em 2009 -, a cantora/produtora britânica alcança o segundo registro de estúdio reforçando uma postura rara em tempos de produções urgentes e obras que normalmente chegam cruas aos ouvintes.

Lento, mas não estático, o presente disco é um passo além em relação ao furor oitentista que organizou grande parte da produção musical na década passada. Ainda íntima da New Wave instalada no single de estreia Quicksand, de 2008, Jackson transforma o novo álbum em uma obra de transição. Por mais que a inaugural Uptight Downtown estenda o exercício projetado no disco de estreia, à medida que a cantora atravessa a obra, o teor nostálgico da década de 1980 se encontra com os anos 1990 e 1970, reforçando a base conceitual do La Roux. Onde antes reinavam projetos como Eurythmics, A-Ha e The Human League, agora surgem gigantes como Grace Jones e Donna Summer.

Apresentado em idos de maio pela extensa Let Me Down Gently, Trouble in Paradise logo foi encarado como uma obra de oposição ao exercício frenético exposto no debut de Jackson. Todavia, não é preciso muito esforço para perceber como a mesma música pop da britânica ainda permanece a mesma, apenas detalhada em uma nova estrutura. Mesmo que canções como Tropical Chancer ou a inaugural Uptight Downtown apostem em uma tonalidade calorosa e propositadamente letárgica, por todo o trabalho músicas como Kiss and Not Tell e Sexotheque resgatam a essência do álbum anterior, arrastando o ouvinte para a pista.

É dentro desse universo de colagens, resgates e pequenas adequações que reside o grande acerto do disco. Enquanto The Ting Tings, Ladyhawke e outros artistas que surgiram na mesma época se acomodaram em uma terrível zona de conforto, Elly Jackson foi além, investindo na transformação. Sim, Trouble in Paradise está longe de ser um álbum encarado como “clássico”, tampouco parece capaz de igualar o acervo de faixas pegajosas do álbum passado, todavia, longe da redundância imediata e do autoplágio autoral que sobrevive do fanatismo cego do público, Jackson evita a redundância e aposta no novo. Trata-se de uma obra de passagem, uma seta indicando os acertos, tropeços e novas possibilidades da cantora ao velho público.

De forma curiosa, as faixas mais atrativas do trabalho são justamente aquelas que escapam da fórmula pronta do registro de 2009. Deliciosamente arrastada e exemplo funcional de toda essa ruptura, Paradise Is You mergulha nas confissões da artista sem necessariamente se tingir de pop. Quase seis minutos de sintetizadores e pianos melancólicos, coros de vozes e batidas comportadas. Um resumo consciente e aprimorado de todas as experiências que borbulham lentamente ao longo do álbum. E o que dizer de Silent Partner, uma faixa de sete minutos que desmonta e reconstrói toda a base do álbum passado? Mesmo a “estranha” Let Me Down Gently parece muito mais confortável dentro do trabalho, deixando de parecer um choque intencional, como há poucos meses indicava, para ecoar como uma resposta natural ao novo estágio de Jackson.

Pouco interessada em seguir o trabalho de novatos como AlunaGeorge, Disclosure e outros recém-iniciados do cenário britânico, La Roux assume um nítido caminho particular. Ao mesmo tempo em que respeita e ainda resgata aspectos da estética proclamada no álbum passado, cada música espalhada pelo novo disco aponta de forma decidida para ruptura. De fato, a simples escolha de uma faixa intitulada “Let Me Down Gently” para apresentar o novo disco apenas reforça o cuidado e a coerência de Elly Jackson em relação ao presente trabalho. Trouble in Paradise, como o título logo entrega, é uma fuga da urgência comercial, do pop previsível e uma obra que merece ser apreciada com total atenção.

Trouble in Paradise (2014, Polydor)

Nota: 7.9
Para quem gosta de: Katy B, Robyn e Little Boots
Ouça: Let Me Down Gently, Paradise Is You e Silent Partner

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.