Disco: “Viet Cong”, Viet Cong

/ Por: Cleber Facchi 11/02/2015

Viet Cong
Post-Punk/Art Rock/Indie Rock
http://vietcong.bandcamp.com/

Vozes parcialmente ocultas pela ambientação caseira das gravações; guitarras sujas, talvez extraídas de algum registro esquecido do pós-punk nova-iorquino. No interior das canções, o aproveitamento “matemático” das palavras, como se a sobreposição cacofônica dos versos servisse de estímulo para a tsunami de distorções que chega em ondas, corroendo a mente do ouvinte ao longo do registro. Descrição de alguma obra (clássica) do Swans, Suicide ou mesmo Sonic Youth no início de 1980? Não, apenas a estrutura caótica que alimenta o primeiro álbum de estúdio da banda canadense Viet Cong.

Nascido da separação do Women, em 2012, de onde vieram Matt Flegel (vocal/guitarra) e Mike Wallace (baterista), a banda completa por Soctt Munro (guitarra) e Daniel Christiansen (baixo) ecoa como natural surpresa mesmo para aqueles que acompanharam o trabalho do extinto coletivo de Calgary. Acomodado em um território (musical) amplo, tão íntimo da presente cena norte-americana como do rock sujo do final dos anos 1970, o quarteto brinca com as possibilidades em cada peça do autointitulado debut, transformando arranjos tão autorais em criações íntimas de gigantes do Art Rock.

Da estrutura lançada pelo grupo em “Cassette” EP, de 2014, todo um novo universo parece adaptado no decorrer do presente álbum. Se há um ano a fórmula “guitarra+baixo+bateria” parecia trabalhada em uma métrica simples, crua, como um passeio rápido pela cena punk de 1977, basta um mergulho na base “avant-garde” de Newspapper Spoons, faixa de abertura do disco, para perceber a ruptura e completa exposição de maturidade do quarteto canadense. Não apenas os instrumentos assumem um enquadramento reformulado, “adulto”, como vocais, versos e fórmulas instrumentais refletem maior refinamento.

Dentro desse jogo de pequenas adaptações e novos direcionamentos estéticos, Viet Cong (o disco) logo revela dois caminhos bem definidos. O primeiro se concentra no natural experimento da banda, uma possível continuação do mesmo ambiente desbravado por Flegel e Wallace nos anos finais do Women. Dos ruídos drone que imperam em March Of Progress ao detalhismo rústico da própria faixa de abertura, tudo flui como uma interpretação particular da obra de veteranos como This Heat, The Pop Group e outros nomes (quase) esquecidos do pós-punk inglês. Referências (ou adaptações) que em nada ocultam o caráter autoral do grupo.

No outro oposto, o lado “pop” do quarteto. Basta se concentrar nas guitarras aceleradas e voz seca de Silhouettes pare perceber o leve descompromisso que rege a obra momentaneamente. Instantes de respiro e possível abertura que resultam na leveza de Continental Shelf ou mesmo nos mais de 11 minutos de Death, faixa em que o grupo canadense prova ser capaz de um material tão complexo como comercialmente acessível – quase uma versão menos “polida” do mesmo Interpol apresentado há uma década em Antics (2004).

Longe de um ponto específico de apoio, cada instante do álbum logo se transforma em inevitável surpresa para o ouvinte. Ruídos sujos que se derretem até ocupar o mesmo território conceitual de Deerhunter, Iceage e outras bandas próximas; guitarras capazes de imitar a mesma imposição de veteranos ativos em um passado recente ou mesmo vozes que parecem extraídas de algum coletivo novato – seja ele da presente cena californiana ou de Nova York em 1977. Colagens que mesmo capazes de atravessar diferentes cenários e “fases” tão isoladas do rock não distorcem a nítida identidade e caminho particular do Viet Cong.

 

Viet Cong (2015, Jagjaguwar/Flemish Eye)

Nota: 8.6
Para quem gosta de: Women, Ought e Iceage
Ouça: March Of Progress, Death e Silhouettes

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.