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Críticas

How To Dress Well

: ""What Is This Heart?""

Ano: 2014

Selo: Domino / Weird World

Gênero: R&B, Soul, Indie

Para quem gosta de: Autre Ne Veut, Blood Orange e James Blake

Ouça: Repeat Pleasure e Word's I Don't Remember

9.0
9.0

Disco: “What Is This Heart?”, How To Dress Well

Ano: 2014

Selo: Domino / Weird World

Gênero: R&B, Soul, Indie

Para quem gosta de: Autre Ne Veut, Blood Orange e James Blake

Ouça: Repeat Pleasure e Word's I Don't Remember

/ Por: Cleber Facchi 25/06/2014

Se você voltar para 2010, quando Tom Krell lançou Love Remains, o primeiro disco do How To Dress Well, encontrará dois artistas completamente distintos. Encoberto por uma nuvem de ruídos e sons caseiros essencialmente ambientais, o desconhecido músico/produtor tentava a todo custo revelar ao público suas amargas impressões. Uma preferência sustentada com acerto em músicas como Suicide Dream 2 e Ready for the World, pequenas evidências do lado mais acessível e melódico do trabalho, além de uma explícita base para o recém-lançado “What Is This Heart?” (2014, Domino/Weird World), a obra mais completa de Krell até o presente momento.

Dissolvido com leveza e encarado como o registro mais comercial do músico, o terceiro álbum solo do How To Dress Well é um exercício de completar as lacunas deixadas para trás no também funcional Total Loss, de 2012. Se há dois anos o músico conseguiu extrair limpidez da massa sorumbática de sons que o apresentaram em começo de carreira, com o novo registro todas as canções surgem ainda mais polidas, íntimas do lado pop do artista – sempre reforçado em suas versáteis mixtapes. Todavia, antes de parecer um registro pré-fabricado, pronto para as massas, o novo álbum mantém firme a postura “anti-The 20/20 Experience“, limando os excessos do (neo-)R&B para presentear o ouvinte com uma obra essencialmente minimalista e complexa – mesmo em toda sua acessibilidade.

Na trilha de músicas como Ocean Floor for Everything e & It Was U, do disco passado, Krell soluciona um registro de fluxo ponderado, revelando menos do que realmente parece interessado. Não por acaso 2 Years On (Shame Dream) e What You Wanted, faixas de abertura do disco, parecem fazer de tudo, menos abrir passagem para o ouvinte iniciante. Uma espécie de filtro para o restante da obra. É somente com a chegada de Face Again que o compositor apresenta a essência do novo álbum, um trabalho fragmentado em pequenos atos e instantes ascendentes, como um grito limpo dentro do cenário antes encoberto em Love Remains.

Ao mesmo tempo em que revela o lado mais acessível do músico – vide o desempenho em See You Fall, Repeat Pleasure e Word’s I Don’t Remember -, “What Is This Heart?” é a obra em que Tom Krell mais se diverte com os experimentos e conceitos lançados por outros artistas. Por mais que a herança de ícones do pop – como Beyoncé, Janet e Michael Jackson – seja evidente em toda a obra, é na travessia pelo trabalho de Autre Ne Veut (Precious Love), Frank Ocean (A Power) e outros nomes do “Indie R&B” que o músico firma crescimento. Sobram ainda orquestrações eletrônicas no melhor estilo Sufjan Stevens (What You Wanted) e readequações estruturais do primeiro disco (Pour Cyril), transformando o novo álbum em um imenso labirinto de sons e tendências a serem revisitadas.

Musicalmente homogêneo e hermético em canções como Word’s I Don’t Remember, “What Is This Heart?” não esconde o aspecto mais grandioso da obra de Tom Krell. Por mais que a faixa de encerramento, House Inside (Future is Older than the Past), sirva como um coeso exemplar da exaltação do músico, por todos as sombras do álbum brilham instantes de plena grandeza – seja de forma lírica ou vocal. Basta perceber o detalhamento encontrado nos instantes finais de Repeat Pleasure, uma fina representação das pequenas explosões sonoras encontradas por Michael Jackson no clássico Off The Wall (1979). Mesmo a esquizofrenia experimental de faixas como Very Best Friend não é capaz de ocultar o lado mais insano do artista, hoje dono de uma liberdade rara se comparado aos primeiros discos.

Se por um lado os versos do novo álbum tendem ao efeito plástico das rimas e colagens de vozes, em se tratando dos arranjos, Krell está longe de encontrar prováveis limites. Diferente da estética exaltada em Love Remains e Total Loss, com o novo disco o caráter artificial – diga-se o uso de samples, recortes vocais e efeitos eletrônicos – é deixado parcialmente de lado, favorecendo uma maior valorização e detalhamento em relação ao uso de instrumentos acústicos (2 Years). Mesmo quando abraça a matemática sintética dos primeiros álbuns – caso de Face Again e A Power -, Krell espalha pianos bem delineados e arranjos eletrônicos detalhistas, rompendo de todas as formas com o teor Lo-Fi de suas primeiras criações.

Próximo do Pop-Experimental testado em mixtapes como NO WORDS TO SAY e Hungover Mix, “What Is This Heart?” é um trabalho em que todas as ideias, influências e assinaturas de Tom Krell podem ser encontradas de forma nítida – sem possíveis bloqueios. A melancolia intimista do cantor ainda se faz explícita em todos os cantos do obra, o que não exclui a curvatura melódica e o curioso brilho pop do produtor – muito mais íntimo daqueles que o influenciaram do que dele próprio. Capaz de amarrar uma série de pontas soltas dentro da música atual, Krell promove um disco que consegue ir além da essência aprimorada do próprio How To Dress Well, revelando um ponto de aprimoramento entre a face mais comercial – Beyoncé, Mariah Carey, Usher – e alternativa – Autre Ne Veut, James Blake, Frank Ocean – de um cenário único muitas vezes encarado de forma fragmentada.

 

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.