Disco: “Woundrous Bughouse”, Youth Lagoon

/ Por: Cleber Facchi 01/03/2013

Youth Lagoon
Dream Pop/Indie/Psychedelic Pop
https://www.facebook.com/youthlagoon

 

Por: Cleber Facchi

Youth Lagoon

É curioso observar a força que um simples título exerce sobre a totalidade de uma obra. E se estivermos falando de Wondrous Bughouse (2013, Fat Possum), novo trabalho do Youth Lagoon, cada sílaba ou frase parece servir como um direcionamento natural para o que é pensado durante a construção do disco. Com base uma observação fantástica e literal, o disco parece relatar a história da “Maravilhosa Casa dos Insetos”, quase o título de um conto infantil e que possivelmente poderia ser ilustrado pela mesma capa de cores exageradas e traço pueril que apresentam o novo álbum ao público. Entretanto, basta um passeio pelo universo de exaltações melancólicas que Trevor Powers desenrola sutilmente, para perceber que o presente disco nada mais é do que um retrato sombrio do manicômio cotidiano que é a vida adulta.

Enquanto o clima matinal e as composições agridoces de The Year of Hibernation (2011) pareciam lentamente acordar o músico de um estágio letárgico, com o presente álbum a compreensão da maturidade e a depressão rompem totalmente com antiga lógica. Por mais encantadoras que sejam as melodias abordadas pela obra (e elas são), cada partícula do registro esbanja uma dor tão profunda, que praticamente afoga tudo o que Powers construiu há dois anos. O amor, a solidão, o abandono, a vida e a morte, tudo serve como assunto para o ambiente desesperador e real que o artista entrega. Um choque que praticamente obriga o músico (e o ouvinte) a abandonar o universo das histórias infantis para tratar sobre a crueza da realidade.

“Você nunca vai morrer, você nunca vai morrer” se desespera o (hoje) adulto Powers em Dropla. Composição mais intensa de todo o trabalho, a faixa sintetiza a amargura do músico (e também a nossa) em ver a infância ficar para trás como uma obrigação para a chegada da vida adulta. Da capa aos sons carregados de referências, o músico se esforça para acrescentar cor ao cotidiano cinza, aqui representado por líricas dilacerantes. Por vezes próximo do trabalho dos Beatles em Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967) – marca clara nas metáforas tragicômicas, no clima circense e na psicodelia pop de Attic Doctor e Pelican Man -, o norte-americano trata de cada composição como um retrato da própria insanidade. Dessa forma, o título do trabalho atende ao real significado de suas palavras, um irônico e “maravilhoso” manicômio.


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Se Wondrous Bughouse é um trabalho de formatação intensa, parte essencial disso vem da instrumentação que rege a obra. Antes acomodado em criações introspectivas e brandas, Powers abandona a zona de conforto para trabalhar em um registro que lida com as orquestrações Lo-Fi de maneia crescente. Um meio termo particular entre o Arcade Fire do álbum Funeral (2004), e as melodias caseiras que fazem de In the Aeroplane Over the Sea (1998) do Neutral Milk Hotel um clássico. Ainda que Mute e Dropla sejam as composições mais facilmente absorvidas do álbum, à medida que o ouvinte se aconchega nas construções sonoras do disco, mais ele revela detalhes impossíveis de serem previstos quando lembramos do ambiente tímido de The Year of Hibernation.

Cada faixa presente no decorrer da obra é trabalhada dentro de pequenos atos. Sleep Paralysis, por exemplo, abre em meio a ambientações típicas do álbum passado, isso até que uma onda de sintetizadores lavem a composição e incendeiam sons inéditos dentro da proposta original do Youth Lagoon. Mesmo atrativa, é somente a partir de Third Dystopia que toda a variedade de novos elementos se apresenta. Entre batidas eletrônicas e sequências nada compactas, a faixa antecipa o que a melancólica Raspberry Cane reformula de maneira acessível, quase comercial, entrelaçando vocais e sintetizadores em um formato que remete à boa fase de Thom Yorke na década de 1990. Até aproximações doces com o Beach House dos primeiros dois discos são possíveis de serem identificadas. Daisyphobia, por sua vez, encerra o trabalho com pequenas contradições intencionais, um misto de maturidade e regresso ao clima infantil do trabalho passado, como se a mente (agora insana) de Powers se perdesse no manicômio que ele mesmo criou.

De forte similaridade com a temática que orientou Hospice (2009), obra-prima do The Antlers, Wondrous Bughouse trata da loucura como um referencial que flutua constantemente entre a metáfora e a realidade. São letras corroídas de pelo desespero de crescer e encarar o cotidiano insano, enquanto melodias ascendentes e quase alegres praticamente obrigam o músico a apresentar o conteúdo obscuro sob outra perspectiva. Uma espécie de sorriso forçado, porém obrigatório, quando tudo o que se quer é apenas chorar. Mesmo que a exata proposta já tenha sido explorada por outros artistas, poucas vezes um compositor consegui analisar o universo de um jovem adulto com tanta veracidade e dor quanto Travor Powers.

 

Youth Lagoon

Wondrous Bughouse (2013, Fat Possum)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Beach House, The Antlers e Silva
Ouça: Dropla, Mute e Raspberry Cane

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.