Discografia Comentada: Bloc Party

/ Por: Cleber Facchi 10/03/2011

Bloc Party
British/Indie Rock/Alternative
http://www.myspace.com/blocparty

 

Por: Cleber Facchi

Passada a batalha de bandas que no começo dos anos 2000 deixaram todo mundo (ou uma pequena parte dele, que talvez fosse até menor do que parece ser) debatendo em bate-papos filosóficos de boteco quem seria o melhor, “The Strokes ou Arctic Monkey”, “The Killers ou Franz Ferdinand”, uma única certeza é a de que o público foi quem realmente saiu vitorioso. Embora o debate ainda perdure, alguns grupos britânicos, norte-americanos ou de algum país esquecido no leste europeu, indubitavelmente saíram de cabeça erguida dessa “guerra”, dentre eles o quarteto londrino Bloc Party.

Depois de um encontro entre Kele Okereke (vocal e guitarra) e Russell Lissack (guitarra) no Riding Festival de 1999, a dupla (que já se conhecia há algum tempo) resolveu de vez partir para a criação de uma banda, ideia que fomentavam a cada novo diálogo esporádico. O interesse de ambos pelo trabalho de grupos britânicos dos anos 80, como Joy Division e The Cure seria o mote para as primeiras criações da banda que ainda indispunha de um nome. Após um anúncio postado na revista NME Gordon Moakes entraria para o grupo como baixista, e passado uma audição Matt Tong assumiria a bateria. Dali para frente só faltaria um nome, que viria após algumas rotulações como Superheroes of BMX e The Angel Range, até finalmente em 2003 se firmarem como o Bloc Party.

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Passadas algumas apresentações em bares pelos subúrbios londrinos, o quarteto faria com que uma demo de She Hearing Voices chegasse até Alex Kapranos, que naquele momento já se destacava com seu Franz Ferdinand. A faixa chegaria também a radio BBC 1, que aos comandos do DJ Steve Lamacq teria grande aceitação do público. Dali para o lançamento do primeiro disco pelo selo independente Wichita Records seria um pulo. Chegaria finalmente em dois de fevereiro de 2005 Silent Alarm, a primeira obra do grupo inglês.

Gravado entre junho e julho do ano anterior, o trabalho concentrava tudo aquilo que o quarteto apresentava em seus shows. Guitarras eletrônicas duelando a todo o momento, um baixo decisivo e que se sobressaia a cada faixa, além de uma bateria tocada com velocidade e precisão, que mais a faziam parecer como uma bateria eletrônica. Ao contrário dos demais grupos que despontavam naquele momento, com sua sonoridade ensolarada e adornada por texturas quentes, o quarteto proporcionava uma sonoridade fria, com acordes dotados de uma precisão quase matemática e livre de qualquer tipo de excesso.

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A ausência de composições que expunham um lado mais festivo como acontecia com Franz Ferdinand, The Killers, Kaiser Chiefs ou demais grupos que pipocavam naquele momento, não quer dizer que a sonoridade do Bloc Party indispusesse de arranjos elaborados ou sons mais sensíveis. Basta ver algumas músicas como This Modern Love, So Here We Are e Blue Light para perceber as pequenas sutilezas expostas por Kale através de suas letras, ou mesmo pela instrumentação assertiva exposta pelos demais integrantes da banda.

Com um total de cinco singles e uma difusão massiva tanto em rádios alternativas como em canais de TV aberta, o sucesso do grupo foi mais do que garantido. Difícil foi encontrar quem não tivesse dançado ao som de Helicopter, cantado com entusiasmo os versos secos de Like Eating Glass ou ainda se emocionado por meio de canções como Pioneers ou Compliments. E não era pra menos. É visível como cada instrumento é exposto com a mais pura vivacidade ao longo de todo o trabalho, como Okereke dispõem seus vocais de forma emocionada e acima de tudo: como a banda era una.

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Ainda aproveitando os louros do primeiro álbum de estúdio, o grupo partiria em 2006 para a gravação de seu segundo trabalho. Com produção de Jacknife Lee – responsável pela produção de discos como Accelerate (2008, R.E.M.) e How to Dismantle an Atomic Bomb (U2, 2004) – o álbum denominado A Weekend in The City (2007) parece funcionar como uma exata sequência do disco de estreia, como se imediatamente ao término de Compliments tivesse início Song For Clay (Disappear Here). Claramente indispondo dos mesmos rifes rasgados do debute, esse segundo disco apresentava o Bloc Party de maneira mais condensada e proporcionando um som ainda mais melancólico como davam pequenas mostras em sua estreia.

Os pequenos toques de experimentalismo, que mais tarde assumiriam o terceiro disco da banda começam a ter início aqui. A influência de grupos como Radiohead (a banda deve ter dissecado Kid A para dar forma a esse álbum) e TV on The Radio tornam-se claras em cada uma das onze composições que definem o trabalho. Embora a veia experimental aumentasse de tamanho com A Weekend in The City, o fascínio do grupo pela sonoridade da década de 1980 ainda se evidenciava. Por todos os lados The Smiths e os já mencionados The Cure e Joy Division passeiam pelas composições do grupo, deixando em cada uma delas pequenos toques de sua influência.

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A sonoridade antes fria parece ganhar contornos acalentadores e sofisticados no desenrolar das faixas. Um arranjo de cordas (incluindo até uma viola) acabam marcando presença em boa parte das canções, o que intensifica a climatização deprimida que se instala no álbum. A predisposição do quarteto em dar vida a um som eletrônico, como acontece em The Prayer, por exemplo, ia aos poucos soltando suas raízes pelo álbum. Tudo que veríamos no terceiro trabalho da banda começava aqui, embora a fluência de um som orgânico ainda se mantivesse presente.

Apesar de que o maior destaque do trabalho tenha ficado mesmo em cima dos quatro singles – The Prayer, I Still Remember, Hunting for Witches e Flux – as faixas menos evidentes dentro do trabalho são as que realmente revelavam o potencial do grupo. Where Is Home, com Okereke cantando de maneira sussurrada enquanto diversos efeitos e programações vão edificando a composição consegue ser incrivelmente superior a qualquer coisa que o grupo já tivesse feito. O mesmo vale para Uniform e depois faixas que apenas engrandecem a carreira da banda.

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Porém, talvez nenhuma das faixas tenha o mesmo cuidado com que o grupo trabalhou a belíssima SRXT. Abrindo de maneira pacata, a canção que encerra o disco entrega os londrinos de maneira suavizada, enquanto vai aos poucos sendo construída por arranjos milimétricos de guitarras, piano e uma percussão baseada em no uso de uma lira glockenspiel. As canções que antes evidenciavam o mesmo Bloc Party do trabalho de estreia, ganha com essa composição um lugar de destaque, apontando toda a excelência do grupo na criação de melodias elaboradas e no uso de uma instrumentação diversificada. Estaria o quarteto apontando o que viria em seu terceiro disco?

A resposta viria de maneira seca através de um grande “Não”. Antecipando em três dias o prazo de lançamento, a banda liberou Intimacy no dia 21 de agosto de 2008 e bastava uma primeira audição para perceber que o grupo vinha diferente. Embora as guitarras que abrem a primeira faixa do disco, Ares, evidenciem uma sonoridade similar a do primo trabalho, o ritmo quebrado e as batidas assíncronas que viriam na sequência mudavam totalmente essa noção. Os vocais de Kele chegam de maneira disforme, como se fossem recortados e colados de maneira incoerente, culminando na criação de um clima excêntrico e desorganizado.

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Quem esperava por composições montadas com uma instrumentação regular na sequência do trabalho acabaria se decepcionando. O álbum era completamente oposto a tudo que a banda já havia trabalhado. A cada nova faixa o grupo entregava outra canção disforme, repleta de batidas inconstantes, sintetizadores cacofônicos e os vocais reconfigurados do vocalista. Embora seja marcado pelo experimentalismo, Intimacy conta com faixas tão acessíveis quanto as encontradas nos dois primeiros discos do grupo. Uma delas é Halo, canção que poderia ser facilmente vista em Silent Alarm, muito por conta de suas doses monumentais de guitarras aceleradas.

Embora uma parte da crítica tenha simplesmente ignorado o álbum, algumas composições expondo a faceta experimentalista da banda são belos achados. Basta apreciar Biko, com seu looping detalhado e pequenas interferências que vão aos poucos solidificando a canção. Se a banda mostrou seu lado romântico com This Modern Love no primeiro disco, Signs assumia essa responsabilidade no novo álbum. Com uma poesia belíssima e uma instrumentação detalhista a faixa mostrava todo o amadurecimento do grupo, coisa que as pessoas pareciam não estar preparadas para ver. É como se todos ainda esperassem um disco aos moldes do primeiro, esquecendo das intenções da banda.

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Não há como contestar que o peso de discos como Dear Science (2008) dos norte-americanos do TV On The Radio, lançado praticamente ao mesmo tempo acabaram fazendo com que o álbum dos britânicos soasse menor do que ele era. No Brasil a situação ficou ainda pior por conta do “fiasco” na apresentação da banda durante o VMB, quando resolveram fazer playback ao invés de se apresentarem de fato. Uma apresentação mediana no Planeta Terra Festival daquele mesmo ano acabaria mais uma vez com a já nem tão boa recepção do novo disco, fazendo com que tudo fosse de vez para o ralo.

O grupo evidenciava o quanto precisava de férias, feito que se realizou logo após o lançamento do estranho single One More Chance. A banda entrou em hiato no dia 31 de outubro de 2009 e de lá pra cá não parece dar sinais de um possível retorno. Kele deu início ao seu homônimo projeto solo, pelo qual lançou o fraco The Boxer (2010). Quem conseguiu um bom resultado foi Lissack som seu divertido trabalho paralelo Pin Me Down, que também em 2010 fez sua estreia. É bem provável que se os projetos paralelos dos músicos não funcionem, logo tenhamos um retorno do Bloc Party. O problema será quanto tempo teremos de esperar até isso acontecer? Enquanto isso, o jeito é dissecar cada um dos três discos ao máximo.

 

Silent Alarm (2005)

 

A Weekend In A City (2007)

 

Intimacy (2009)

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.