Lollapalooza Brasil: os acertos e erros do festival

/ Por: Cleber Facchi 08/04/2014

Por: Cleber Facchi

Lollapalooza Brasil

Dois dias, mais de cinquenta artistas e muitos, muitos quilômetros para circular entre uma atração e outra. Quem se aventurou pela edição 2014 do Lollapalooza Brasil foi acompanhado por dois dias de sol forte, muito movimento por parte do público e, claro, música por todos os lados.

Em nova casa – o evento deixou o Jockey Club, região Oeste de São Paulo, para se acomodar no Autódromo de Interlagos -, o festival organizado pela Time4Fun trouxe uma seleção variada de artistas, apresentando desde gigantes da música atual, como Arcade Fire e Muse, até veteranos dos anos 1980 (New Order, Johnny Marr) e 1990 (Soundgarden e Nine Inch Nails). Sobraram ainda novatos, caso de Lorde, Savages e Disclosure, todos autores de boas performances.

No meio desse cenário abastecido pela música e a força do público – que subiu e desceu ladeiras para acompanhar cada show -, aqui vão alguns dos erros e acertos que tomaram conta dos dois dias do festival.

Acesso ao Autódromo (acerto)

Chegar ao Autódromo de Interlagos nunca antes foi tão fácil. Além dos funcionários espalhados em diferentes estações/terminais de São Paulo, o uso de setas indicativas e pessoas com auto-falante na saída ou entrada do evento tornaram o acesso ainda mais dinâmico e descomplicado. Quem desceu na estação Autódromo, por exemplo, encontrou um caminho seguro até a região do festival, com diversas placas espalhadas por todo o percurso.

Retirada dos Ingressos (erro)

Assim como na última edição do Planeta Terra, evento também organizado pela Time4Fun, quem deixou para retirar o ingresso no dia do evento teve de esperar horas na fila até ser atendido. Erro no sistema, funcionários pouco capacitados e uma série de adversidades fizeram com que, mesmo quem chegasse cedo, perdesse algumas das atrações.

Horários/Escalação (acerto)

A regra de qualquer festival de música é: você nunca vai ver todos os shows que você deseja. Todavia, a ordem cuidadosa dos horários fez com que diferentes públicos e a transição entre os palcos fosse tratada de forma coesa – principalmente no domingo.

Ainda que alguns tropeços tenham ocupado os dois dias do evento – como Lorde e Phoenix no mesmo horário, no sábado, ou Vampire Weekend e Savages no domingo -, em geral, o festival conseguiu isolar diferentes públicos, criando apresentações que fossem pensadas para faixas etárias distintas e gostos específicos. Não quer ver Muse? Que tal Disclosure? Arcade Fire é muito hipster? Mate a saudade dos anos 1980 com New Order.

Lollapalooza

Som (erro)

Em um cenário em que cada artista assume uma sonoridade específica, o cuidado com o som deve ser redobrado, e isso não aconteceu no Lollapalooza 2014. Enquanto o duo Disclosure teve o áudio baixíssimo na noite de sábado – era possível conversar sem dificuldades durante a apresentação -, outros como Julian Casablancas exageraram na dose – e não diga que foi proposital -, tornando alguns aspectos do show insuportáveis.

A própria apresentação do Arcade Fire, um dos grandes nomes do festival, foi prejudicada pelo desnível de áudio no microfone dos vocalistas Win Butler e Régine Chassagne. Pelo menos não houve vazamento de som, diferente das edições anteriores, no Jockey, em que o som de um palco atravessava o outro.

Alimentação e Bebidas (acerto)

O grande problema de quem pretende se alimentar em qualquer festival de música é a qualidade baixíssima dos alimentos fornecidos. Lanches feitos no microondas, comidas tão industrializadas que mais parecem isopor e um cardápio sempre limitado de opções. Não foi assim com o Lollapalooza.

Além do requisitado Chef Stage – que nos próximos anos poderia ser ampliado ou fragmentado em outros espaços -, a comida servida nas barraquinhas estava longe de ser ruim. Batatas fritas na hora, lanches variados e uma série de outros alimentos que não apenas enganaram o estômago, como sustentaram o público para os dois dias do evento. A mesma percepção é válida para a circulação de água, cerveja e refrigerantes dentro do festival. Diferente dos outros anos, as filas foram menores e quem procurou por áreas alternativas para se hidratar foi atendido rapidinho.

Julian Casablancas

Julian Casablancas (erro)

De todas as apresentações do festival, a de Julian Casablancas foi a mais sofrível. Também vocalista do The Strokes, o músico nova-iorquino até tentou em alguns momentos – como no hit 11th Dimension -, mas viu o público se esvair conforme a apresentação se estendeu.

Vocais poluídos por efeitos robóticos, guitarra e bateria descompassadas, desnível de áudio e parte significativa do show preenchida por monólogos desnecessários. Casablancas parecia mais interessado em perguntar se o público gostava de futebol do que cantar em si. Há quem diga que toda a “desordem” ao lado do The Voidz, banda que acompanhou o músico, foi proposital. Duvido.

Atrações alternativas (acerto)

Pista de patinação, um bar nas alturas, lojas para comprar discos de vinil, espaço para deitar, sentar e esperar entre um show e outro. Enquanto as edições anteriores, no Jockey, foram comprometidas pela ausência de espaços alternativos e o lodo que dificultava a circulação do público, para a edição 2014 do Lollpalooza, o público foi presenteado com diferentes atrações nos dois dias do evento. Andou bastante? Ora, descanse um pouco na área relax, ou estique a canga no gramadão verde e tire um cochilo.

Atendimento ao público (acerto)

É possível fazer um evento sem tratar o público com truculência? Sim, e o Lollapalooza 2014 provou isso. Além dos diversos funcionários espalhados por todo o Autódromo, dando informações e apontando as direções para o público, quem foi comprar cerveja, comida ou simplesmente tirar as fichas foi bem tratado.

Com água sendo distribuída de graça na frente do palco – o que garantiu o sustento de muita gente entre um show e outro -, além de postos médicos funcionais, só passou mal (mesmo) quem exagerou na dose.

Aplicativo (acerto)

O App do Lollapalooza para smartphone lançado em 2013 já havia salvo muita gente, mas em 2014 ele se transformou em um item essencial dentro das pistas do Autódromo. Além do funcional despertador para alertar sobre o início de cada show, a possibilidade de montar a própria grade dos horários serviu para facilitar a vida do público.

O melhor de tudo foi o mapa com geolocalização, tornando a passagem entre os distantes palcos Interlagos e Ônix um pouco mais rápida. Pena que a organização do evento não instalou maiores áreas para carregar os celulares.

Lorde (acerto)

Lorde está longe de ser encarada apenas como uma “cantora adolescente”. Madura, a jovem neozelandesa fez da passagem pelo Lollapalooza um espaço para reforçar a identidade/grandeza em torno de sua obra, efeito que orquestrou a artista da abertura ao fechamento do show.

Acompanhada apenas de dois instrumentistas e um palco livre de grandes estruturas, a artista ocupou todas as lacunas da apresentação com danças esquizofrênicas, vocal firme e, claro, a devoção do público. Não faltaram músicas como Ribs, Team e o hit Royal, esta última livre da carga de efeitos sintéticos e que reforçaram todo o domínio da cantora no palco.

Circulação entre os palcos (erro)

Cansou de caminhar? Reclamou da distância entre os palcos? Ora, então você não está pronto para ir ao festival, afinal, o que mais se faz em qualquer grande evento de música – aqui, nos Estados Unidos ou na Europa – é andar. O problema foi o péssimo aproveitamento dos espaços de conexão entre os palcos.

Na passagem entre os palcos Skol e Interlagos, por exemplo, tanto o Chef Stage como as diversas barraquinha de comida espalhadas pelo caminho tornaram o percurso excessivamente lento – diversas filas bloqueavam a passagem do público. Na noite de sábado, depois do show de Lorde e a caminho para o show do Muse, a baixa luminosidade tornava tudo ainda pior. Foi impossível circular em diversos pontos.

Arcade Fire (acerto)

A maturidade tomou conta da apresentação do Arcade Fire. Quase uma década desde a primeira passagem pelo Brasil, o grupo canadense fez do show no Lollpalooza um espetáculo marcado por hits (Reflektor, The Suburbs), composições queridas do público (Laika, Ready To Start) e até versões para músicas brasileiras – caso de O morro não tem vez, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes e Nine out of ten, de Caetano Veloso.

Teatral, a apresentação contou ainda com mascaras gigantes, chuva de papel picado, um homem “vestido de espelho” e o completo domínio da banda, capaz de fazer o público dançar (em Here Comes The Night Time) ou se emocionar (com It’s Never Over). Após o final épico, com a intensa Wake Up, Win Butler, vocalista da banda, fez uma promessa: se o Brasil ganhar a Copa do Mundo, na próxima passagem do grupo pelo país, todos se apresentam vestindo a camisa da seleção.

Volta para casa (erro)

Ainda que durante a noite de domingo o caminho até o trem, o acesso aos ônibus ou mesmo a circulação de taxis tenha sido positiva, no sábado, o caos tomou conta de toda a região no entorno do Autódromo. Não havia taxis, os ônibus circularam abarrotados de gente e na frente da estação da CPTM uma massa de pessoas tentava a todo custo entrar na estação – sem fila ou mínima organização aparente.

O pior de tudo: não havia pessoas da organização para informar se o trem circularia além do horário limite (1h00 da manhã), o que tornou a situação ainda mais tensa. Houve ameaça de invasão, grade quebrada e gente que desmaiou no meio da confusão.

Autódromo, a nova casa do festival? Sim!

Amplo espaço para descanso, palcos que não tiveram vazamento de som e o vento que ajudou a refrescar durante os dois dias do evento, sim, o Lollapalooza encontrou um novo espaço em São Paulo. Seja sincero: você prefere caminhar um pouco mais na grama/asfalto ou se afundar em lama enquanto como foi no Jockey?

Sim, a distância entre os palcos – principalmente Interlagos e Ônix – serviu para desmotivar o público, mas a quantidade de atributos positivos, como áreas para relaxar, banheiros funcionais, boa comida e diferentes atividades entre um show e outro, deram ao Lollapalooza uma “cara de festival” inexistente nos outros anos.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.