O dia que em que a Cannabis (quase) parou Karina

/ Por: Cleber Facchi 24/03/2012

Por: Cleber Facchi

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Era por volta das 11:30 da manhã quando Karina Buhr, acompanhada de um verdadeiro panteão de componentes da música nacional, desceu ao palco do espaço de shows do Parque Villa-Lobos, região oeste de São Paulo. O que tinha tudo para ser apenas mais uma das memoráveis (e sempre performáticas) apresentações da artista, foi bruscamente interrompida. Enquanto entoava os primeiros versos da pacata Sem Fazer Ideia (“Andando, por motivo de força maior/ Eu queria muito ir embora dali”), um homem ligado à administração do Parque subiu ao palco, impedindo a realização do show. Com o microfone cortado, a banda deu continuidade a apresentação, até que no executar da segunda música todos os instrumentos foram silenciados.

O motivo da interrupção? “A gente estava fumando uma maconhazinha no camarim” justificou a cantora, perceptivelmente revoltada, para o público que se aglomerava nas arquibancadas. Entre gritos, vaias e a presença da polícia nos arredores do espaço, após quase 20 minutos de espera o espetáculo foi retomado, com Karina e a banda dando continuidade ao que fora interrompido minutos antes. Com um repertório dividido entre os dois trabalhos da artista pernambucana – Eu Menti Pra Você de 2010 e Longe de Onde de 2011 –, a apresentação foi aos poucos se desvencilhando da confusão gerada no inicio, servindo por fim como ferramenta de estímulo para que os vocais da cantora ganhassem certo tom raivoso e por vezes irônico.

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Por mais que o show fosse inteiramente dela – é difícil não desviar os olhos da performance quase teatral proposta pela cantora -, grande parte do que garante sustento ao bem executado espetáculo vem dos músicos que a acompanham. Mais do que seguir rigorosamente a estrutura proposta dentro dos registros em estúdio, ao vivo as composições de Buhr ganham vida própria, se alimentando da guitarra chapada de Fernando Catatau (Cidadão Instigado) ou mesmo dos bem ordenados instrumentos que acompanham a cantora durante toda a atuação. Até o trompete de Guilherme Mendonça (Guizado), que nos discos passeia ao fundo das músicas, em versão ao vivo ganha amplo destaque, servindo em diversos momentos como elemento de centro para as canções.

Nas mãos de Karina, boa parte do público se manteve em pé e ativo durante toda a execução do show. Talvez fosse medo de que a apresentação fosse novamente interrompida, ou quem sabe estivessem simplesmente hipnotizados pelas caras, bocas, chutes e pontapés desferidos pela instável artista a cada nova canção. Com uma expressão corporal própria e excêntrica, Buhr desfilou memorável durante a realização de todo o espetáculo, correndo, se arrastando e dançando pelo palco com um fôlego raro. Trajando um maiô brilhante, ela surge com ares de diva pop dos anos 70 com o espírito de uma dançarina de axé da década de 1990. Uma mistura tecnicamente incompatível, mas que dentro da performance da cantora funciona estranhamente bem.

 

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Karina sabe como prender o público como nenhum outro artista nacional – seja ele independente ou membro do alto escalão da música brasileira. Talvez venha daí o fato do que boa parte das pessoas que passavam pelo parque ou mesmo aqueles que desconheciam as músicas acabavam fisgados pela estranha vocalista de cabelos ruivos e ações performáticas. Um figura inquieta que brinca de maneira estranha com as palavras e os peculiares sons gerados entre elas. Buhr é o que existe de melhor na música brasileira e não há polícia, interrupções ou qualquer ponta solta que possa prejudicar isso.

 

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.