Os Melhores de 2015: Lista dos Leitores

/ Por: Cleber Facchi 04/01/2016

LISTA NACIONAL

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#10. Emicida
Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições… (2015)
Total: 37 pontos

Nunca antes Emicida pareceu tão esperançoso e ainda sóbrio quanto nas canções de Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa… (2015). Segundo trabalho em estúdio do paulistano, o registro de melodias descomplicadas e rimas “fáceis” é, como indicado pelo próprio rapper, um verdadeiro “Cavalo de Tróia”. Uma obra de sonoridade acessível, convidativa aos mais variados públicos, porém, ainda forte, agressiva, dona do mesmo discurso conciso que define a obra do artista desde a estreia com a mixtape Pra Quem Já Mordeu Um Cachorro Por Comida, Até Que Eu Cheguei Longe… (2009). De forte apelo emocional, vide a abertura com a melancólica Mãe – “Uma vida de mal me quer, não vi fé / Profundo ver o peso do mundo nas costa de uma mulher” -, o presente disco, assim como o antecessor O Glorioso Retorno de Quem Nunca Esteve Aqui (2013), nasce como um trabalho em que Emicida ultrapassa os limites da periferia de São Paulo para dialogar com os mais variados grupos de marginalizados. Mulheres, homossexuais, trabalhadores, dependentes químicos e, principalmente, os negros. []

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#09. Jair Naves
Trovões a Me Atingir (2015, Independente)
Total: 37 pontos**

Descrença, solidão, medo e morte; temas corriqueiros dentro do acervo poético de Jair Naves enquanto vocalista da extinta Ludovic, porém, um catálogo de experiências cada vez menos significativas no universo autoral que define a carreira solo do cantor. Se em 2006, quando apresentou o derradeiro Idioma Morto, Naves gritava a plenos pulmões, exaltando sentimentos e toda sua raiva em relação ao mês de janeiro – “o pior dos meses” -, curioso perceber no mesmo mês, data escolhida para o lançamento do segundo disco solo do músico, Trovões a Me Atingir, uma completa oposição desse resultado. Da capa iluminada aos arranjos suavizados, dos versos marcados pela esperança ao refrão vívido da faixa-título – “meu corpo volta a ter pulsação” -, difícil ignorar a transformação que define a presente obra do paulistano. Ainda que a melancolia tome conta de boa parte do trabalho, marca explícita nos instantes finais e respiros breves do registro, seria um erro não observar o conceito “sorridente” que sustenta a atual fase de Naves. As angústias e trovões – como indicado no título da obra -, ainda atingem o compositor, por todos os lados, entretanto o nítido senso de superação parece maior, raro quando voltamos os ouvidos para o contexto macambúzio do ainda recente E Você Se Sente Numa Cela Escura… (2012). []

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#08. Ventre
Ventre (2015, Independente)
Total: 38 pontos

Desde Idioma Morto (2006), derradeira obra da banda paulistana Ludovic, que um disco brasileiro não me parecia tão urgente, raivoso e essencialmente honesto quanto a estreia do grupo carioca Ventre. Nascido do encontro entre os músicos Gabriel Ventura, Larissa Conforto e Hugo Noguchi, o trabalho de 11 composições densas faz de cada ato instrumental uma explosão movida por temas como sexo, separação e isolamento. Produzido ao longo de dois anos, com gravações registradas em diferentes estúdios, a homônima obra do trio carioca é um caso raro dentro da presente fase do rock nacional. Longe da crueza habitual de outras obras do gênero – montadas em cima da satisfação do amadorismo -, cada uma das canções se espalha em um mundo de detalhes, sobreposições de vozes e encaixes que mantém a atenção do ouvinte em alta até a chegada de Aperto e Um Beijo, faixa de encerramento do disco. Um labirinto de sensações melancólicas que se espalha de forma tumultuada, dialogando com a lírica dolorosa e particular de Ventura. White Pony (2000) do Deftones encontra com The Bends (1995) do Radiohead; guitarras replicam conceitos lançados por veteranos como Queens Of The Stone Age, The Jimi Hendrix Experience e The Who; vozes abraçam o mesmo desespero que marca a obra de Jeff Buckley, Fiona Apple e Kurt Cobain. No cardápio de referências incorporadas pela banda, sentimentos e instrumentos se chocam com naturalidade. Uma alavanca para o rico catálogo de versos que tingem com melancolia (e desespero) cada fragmento do registro. []

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#07. Cidadão Instigado
Fortaleza (2015, Independente)
Total: 42 pontos

Climáticos, os sintetizadores crescem lentamente. Ao fundo, guitarras espalham ruídos, sem pressa ou possíveis exageros. A bateria ocupa espaço com timidez, abrindo passagem para que a voz de Fernando Catatau ecoe de forma clara, como um suspiro aliviado: “até que enfim”. Com os pés firmes no chão, passados seis anos desde o lançamento do último álbum de estúdio, Uhuuu! (2009), o grupo cearense Cidadão Instigado deixa de lado do som experimental (e lisérgico) dos primeiros trabalhos para investir em uma obra pontuada pela saudade, melancolia e completa lucidez. Fuga dos temas e arranjos complexos testados desde a boa fase em O Ciclo da Decadência (2002) e Cidadão Instigado e o Método Túfo de Experiências (2005), com Fortaleza(2015, Independente) a banda – completa com Regis Damasceno, Clayton Martim, Rian Batista e Dustan Gallas – revela ao público uma sonoridade talvez “simples”, mas não menos convincente. Livre da estrutura torta e limitadora de faixas como O Pinto de Peitos e Deus É Uma Viagem, o canto triste de Catatau se despe do manto colorido, transporta o ouvinte para um cenário obscuro e ainda cria brechas acessíveis aos mais variados público. []

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#06. Cícero
A Praia (2015, Independente)
Total: 50 pontos

Romântico, brega, chato ou, como defende o público fiel, “um gênio incompreendido”, “um poeta”. Cícero pode ser acusado e classificado das mais variadas formas, porém, goste ou não do trabalho assinado pelo músico carioca, em nenhum momento ele pode ser encarado como previsível. Exemplo significativo desse resultado está na estrutura e (ainda falho) conceito executado em Sábado (2013), segundo álbum solo do cantor. Talvez mal interpretado, um “Araçá Azulparticular“, a obra entregue há dois anos está longe de parecer o ponto central da (curta) obra do jovem compositor. Ainda atento, Cícero mantém firme a busca pela própria identidade, postura explícita no horizonte infinito que estampa a capa e sonoridade aplicada em A Praia (2015, Independente). Uma rápida audição, e a reposta parece surgir de forma imediata: com o terceiro e mais recente trabalho de inéditas, Cícero talvez tenha encontrado um meio termo exato entre o “samba-indie-melódico” do registro de estreia, Canções de Apartamento (2011), com o “experimento caseiro” testado no interior do segundo álbum, Sábado. Um erro. Ainda que a maquiagem eletrônica de Frevo por acaso N˚2 e diferentes faixas espalhadas pelo registro sustentem a parcial novidade por parte do músico, está na composição quase sorridente dos versos o aparecimento de um novo “personagem” e poeta. []

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#05. Boogarins
Manual (2015, StereoMono)
Total: 58 pontos

Leve. Dois anos após o jogo de cores e exageros lisérgicos que marcam o inaugural As Plantas que Curam (2013), estreia do grupo goiano Boogarins, Dinho Almeida, Benke Ferraz e os parceiros Raphael Vaz e Ynaiã Benthroldo mergulham de cabeça no plano onírico para encorpar as canções do recém-lançadoManual. Uma coleção de vozes delicadas e arranjos tingidos pela nostalgia da música psicodélica, mas que encontram no descompromisso sorridente da banda um poderoso traço de identidade. Em um nítido distanciamento da herança deixada por veteranos (Os Mutantes) e novatos (Tame Impala) do rock psicodélico, cada faixa do presente disco reforça a capacidade do grupo brasileiro em brincar com a própria essência musical. Instantes, quebras e colagens descomplicadas em que o grupo passeia pelo minimalismo da bossa nova (Cuerdo), autoriza a explosão das guitarras (Avalanche) ou simplesmente colide fórmulas (Mario de Andrade / Selvagem) sempre em busca de um som não linear. Como anunciado no subtítulo da obra – “Guia Livre de Dissolução dos Sonhos” -, Manual está longe de ser um registro orientado pela certeza. Entre vozes e arranjos enevoados, por vezes preguiçosos como as derradeiras San Lorenzo eAuchma indicam, faixa após faixa, o grupo se concentra na produção de um trabalho de composição leve, íntimo das experiências e alucinações hipnagógicas. Em um constante estado de letargia, todos os elementos parecem agrupados com extrema delicadeza, atraindo o ouvinte para dentro de um labirinto de bases e texturas que parecem flutuar. []

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#04. Gal Costa
Estratosférica (2015, Sony Music)
Total: 59 pontos

Diálogo aberto com pequenos gigantes da atual geração – entre eles, Marcelo Camelo, Mallu Magalhães e José Paes Lira -, Estratosférica,  registro produzido Alexandre Kassin e Moreno Veloso, é um passeio pela essência versátil da cantora. Enquanto a inaugural Sem Medo Nem Esperança aponta para a boa fase no começo dos anos 1970, marca explícita na crueza das guitarras e o “solo de voz” típico do clássico Fa-Tal – Gal a Todo Vapor (1971), em minutos, o uso de temas eletrônicos (Muita Sorte) e até melodias mais “pop” (Quando Você Olha Pra Ela) confortam a artista no cenário plastificado dos anos 2000. De cara, o grito forte (“Não sou mais tola / Não mais me queixo / Não tenho medo / Nem esperança”) e a ânsia pela própria renovação (“Nada do que fiz / Por mais feliz / Está à altura / Do que há por fazer”) de Sem Medo Nem Esperança. No interior do trabalho, faixas que poderiam ser encaixadas em obras da década de 1980 (Jabitacá) ou mesmo na fase tropicalista (Anuviar) da cantora. Sobra até espaço para a exposição da própria sexualidade em Por Baixo (“E por baixo dos pelos: as estradas / Que conduzem nos fios os teus arrepios / Manifestos em ois! E uis! E ais!”), um fino retrato da poesia versátil de Tom Zé. []

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#03. Tulipa Ruiz
Dancê (2015, Natura Musical)
Total: 61 pontos

Aos gritos de “Começou! Começou!”, Tulipa Ruiz anuncia: o acesso à pista de dança foi liberado. Fuga evidente do “pop florestal” que apresentou a cantora paulistana em Efêmera, de 2010, Dancê (2015, Natura Musical) não apenas reforça o caráter urbano que orienta o trabalho da artista desde o último álbum de estúdio, Tudo Tanto (2012), como entrega ao público uma cantora renovada, mais uma vez atenta ao som pop dos primeiros registros, porém, descomplicada e, claro, dançante. Quem esperava pela produção de um som “regional” por parte de Ruiz, marca explícita no ritmo carnavalesco de Megalomania ou na recente colaboração com o paraense Felipe Cordeiro, em Virou, encontrará o oposto. Da flexibilidade das guitarras ao posicionamento enérgico dos vocais, dos versos que discutem temas cotidiano ao transparente véu eletrônico que cobra parte do trabalho, Ruiz caminha pelas pistas da capital paulista de forma a produzir um som homogêneo, quase acinzentado, como uma fuga da atmosfera “hippie” lançada em faixas como A ordem das árvores ou Efêmera. Curioso pensar que parte expressiva do recente trabalho foi concebido no isolamento de uma casa de campo, no interior de São Paulo. []

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#02. Jaloo
#1 (2015, StereoMono)
Total: 69 pontos

Como escapar de um álbum cuja faixa de abertura já nasce como um convite? Impossível. “Ah! Vem pra cá / Balançar / Se acabar / Sente o som / Tudo é bom”, entrega o cantor e produtor paraense Jaloo na inaugural Vem. Escolhida para apresentar o primeiro registro de inéditas do artista original da cidade de Castanhal, região metropolitana de Belém, a faixa adornada por sintetizadores e vozes crescentes, mais do que um eficiente cartão de visita, indica a direção festiva, lisérgica e sempre colorida que orienta cada uma das 12 composições do debut #1 (2015, MonoStereo). Björk, tumblr, anime, GIFs e tecnobrega. Nascido da reciclagem de temas e referências que cercam o cotidiano do artista, a obra que conta com direção artística de Carlos Eduardo Miranda (Raimundos, Nevilton) cresce como um assertivo jogo de exageros. Da imagem plastificada que estampa a capa do disco – similar ao trabalho de Jesse Kanda ao lado de artistas como FKA Twigs e Arca -, passando pelo encaixe cíclico dos versos, sempre pegajosos, Jaloo finaliza um disco que resume as últimas três décadas da música pop sem necessariamente perder a própria identidade. []

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#01. Elza Soares
A Mulher do Fim do Mundo (2015, Circus/Natura Musical)
Total: 143 pontos

Incansável. Aos 78 anos, dona de 34 álbuns de estúdio, Elza Soares faz valer o verso central da faixa que garante título ao primeiro registro de inéditas em mais de 60 anos de carreira. “Me deixem cantar até o fim”, despeja a artista na música composta por Romulo Fróes e Alice Coutinho. Em A Mulher do Fim do Mundo , o samba sujo de São Paulo se encontra com a essência carioca, sempre quente, da veterana, resultando em um passeio que atravessa diferentes décadas, cenários e personagens de maneira explosiva, caótica. Cercada por Kiko Dinucci, Thiago França, Romulo Fróes, Marcelo Cabral, Celso Sim, Guilherme Kastrup e boa parte dos integrantes do Bixiga 70, Elza reaparece transformada, íntima da presente safra de artistas paulistanos. Em um lento desenrolar dos versos que tem início em Coração do Mar, poema de Oswald de Andrade musicado pelo velho parceiro José Miguel Wisnik, cresce o cenário marcado pela destruição, conflitos, choro, sexo e libertação.  Em um atento exercício de renovação – talvez maior do que Caetano Veloso em (2006) ou Gal Costa no eletrônico Recanto (2011) -, Soares flerta com a linguagem das ruas em Firmeza – “Pena que corre é mil grau… É a life meu, irmão” -, e ainda detalha o sexo de maneira quase explícita, agressiva, em Pra Fuder – “Unhas cravadas induzem latejo / Roupas jogadas no chão / Pernas abertas te prendo num beijo”. Do vocal torto ao uso de temas instrumentais que se quebram durante toda a obra, cada elementos se encaixa com naturalidade, garantindo passagem até o lamento triste que marca a derradeira Comigo – “Levo minha mãe comigo / De um modo que não sei dizer”. []

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LISTA INTERNACIONAL

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#10. Joanna Newsom
Divers (2015, Drag City)
Total: 31 pontos

Se você procurar por Joanna Newsom no Google, dificilmente encontrará um site oficial atualizado ou mesmo contas em diferentes redes sociais. Músicas no Spotify? Somente raras parcerias assinadas ao lado de outros artistas – caso de Right On, do coletivo The Roots. Em entrevistas recentes, a cantora reforçou ocompleto desprezo pela plataforma e outros serviços de streaming. Salve a seção no site do selo Drag Music, também responsável pela publicação dosvídeos da artista no Youtube, Newsom parece viver isolada, distante da tecnologia, temas e tendências que movimentam o cenário atual. Prova explícita desse “distanciamento” ecoa no peculiar jogo de palavras que cresce em cada novo trabalho da cantora. Termos arcaicos, não convencionais, como “hydrocephilitic”, “antediluvian” e “Tulgeywood” que acabaram se transformando em objeto de análise (ou piada) em diferentes publicações. Longe da rima fácil, do canto comercial e descomplicado, Newsom parece acomodada em um ambiente próprio, detalhando faixas que ultrapassam os 10 minutos de duração em uma montagem quase textual. Curioso perceber que mesmo isolada, habitante de um universo tão intimista, poucos artistas atuais exercem um fascínio tão grande no público quanto Joanna Newsom. Basta perceber a infinidade de artigos, publicações e especiais lançados em diferentes veículos nos últimos meses. Se faltam caminhos “oficiais” para chegar até o trabalho da artista, sobram publicações no Reddit e vídeos(ao vivo) compartilhados pelos próprios ouvintes da cantora. Uma euforia coletiva que se sustenta na coesa execução de Divers. []

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#09. Father John Misty
I Love You, Honeybear (2015, Sub Pop)
Total: 33 pontos

Em uma explícita curva conceitual, dentro até da própria carreira, Joshua Tillman assina um trabalho muito maior do que a previsível seleção de ” contos” imaginada desde último álbum do músico, o debut Fear Fun (2012). Mesmo sob o título de Father John Misty, cada verso deriva de fragmentos pinçados do cotidiano do cantor. Uma obra ainda irônica e carregada humor – vide o relato em I Went to the Store One Day ou o anti-hino de Bored in the USA -, mas ao mesmo tempo sensível, centrada no convívio, amor e conflitos ao lado da esposa do cantor, a diretora Emma Elizabeth Tillman. Esquivo de versos açucarados, típicos em obras “apaixonadas”, Tillman deturpa toda a fantasia do amor nos primeiros instantes do disco, logo que a faixa-título se apresenta ao ouvinte. Em meio ao coro de arranjos e vozes suavizadas – “Honeybear, honeybear, honeybear” -, o contrastado encaixe de palavras “sujas” – “rímel, sangue, cinzas e esperma“-; um relato cru, real, de qualquer casal depois do sexo. Entre recortes intimistas e versos de fácil transposição, o mesmo lirismo honesto aos poucos invade todo o registro. Uma obra quase invasiva, salva pelo humor flexível do artista. []

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#08. Florence and The Machine
How Big, How Blue, How Beautiful (2015, Island)
Total: 45 pontos

As guitarras “falam” mais alto em How Big, How Blue, How Beautiful (2015, Island). Terceiro registro de inéditas do Florence and The Machine, o novo álbum pode até seguir a trilha dos antecessores Lungs (2009) e Cerimonials (2011), entretanto, indica uma direção totalmente nova dentro da curta obra da artista britânica. Em um diálogo preciso com a música pop e o rock dos anos 1980, Florence Welch se despe de possíveis conceitos e temas complexos de forma a revelar um trabalho marcado pela coerência, rico acervo de composições melódicas e sentimentos nunca antes tão detalhadamente expostos. Fuga dos atos cênicos e extensa duração do operístico álbum de 2011, com o novo disco, Welch e os parceiros de produção, Markus Dravs e Paul Epworth, trazem de volta o mesmo ritmo “acelerado” do inaugural Lungs. Enquanto Dravs – produtor responsável pelos últimos discos do Arcade Fire -, garante dinamismo ao trabalho, é responsabilidade de Epworth – com quem Florence vem colaborando desde o primeiro registro -, além de nomes como James Ford (Simian Mobile Disco), garantir maior polimento e delicada reprodução ao acervo de músicas comerciais que preenchem toda a obra. []

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#07. Jamie XX
In Colour (2015, XL / Young Turks)
Total: 50 pontos

Jamie Smith lançou a primeira música em carreira solo. Durante uma rápida entrevista à rádio inglesa XFM, em setembro de 2010, o jovem produtor não apenas revelava ao público o autoral single Far Nearer, como ainda sussurrava de forma tímida e claramente indecisa o nome escolhido para esse novo projeto: Jamie XX. Seis anos mais tarde, a timidez do músico londrino permanece evidente em cada ato, canto ou sample reciclado no interior de In Colour (2015, XL / Young Turks), todavia, o mesmo não pode ser dito sobre a suposta indecisão do artista. Do ritmo crescente que abre o trabalho na faixa Gosh, seguindo pelo cruzamento de ritmos que vai do Pós-Dubstep (Hold Tight) ao Hip-Hop (I Know There’s Gonna Be Good Times), passando pelo minimalismo de Girl, já conhecida faixa de encerramento do disco, o britânico sabe exatamente onde quer chegar. Confortável e rodeado por colaboradores de longa data – entre eles o produtor Kieran Hebden (Four Tet) e os parceiros do The XX, Romy Madley Croft e Oliver Sim -, Smith revela em essência o universo de referências coloridas que há tempos ocupa sua mente. []

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#06. Grimes
Art Angels (2015, 4AD)
Total: 57 pontos

Em agosto de 2013, convidada a participar de uma das edições da série Boiler Room, Grimes causou polêmica por conta do repertório apresentado ao público. Entre canções autorais e faixas de outros artistas, o que de fato chamou a atenção foi a avalanche de composições pop que preencheram o set da artista canadense. Taylor Swift, Mariah Carrey, Skrillex e até o “clássico”We’re Going to Ibiza, do grupo holandês Vengaboys. Acusada de trollar o projeto, no Twitter, a cantora se defendeu: “Eu não acho que exista um ‘livro de regras’ dos DJs. Nada do que eu faço é irônico”. Ainda que a apresentação não tenha sido publicada no canal do Boiler Room, no Youtube, mesmo sob o pedido e petição do público, com a “curiosa” performance, Grimes parecia indicar o caminho que seria musicalmente incorporado após a divulgação do etéreo Visions (2012). Em busca de um som cada vez mais pop, a artista se mudou para Los Angeles, acabou se envolvendo com figurões da música local, lançou a pegajosa Go – faixa originalmente composta para Rihanna -, e, poucos meses depois, insatisfeita com o resultado do material produzido, decidiu abandonar tudo e trabalhar sozinha no Canadá. Fruto desse universo de novas experiências, mudanças e relações conturbadas, Art Angels reforça a busca da artista canadense por um som completamente distinto em relação ao material entregue há três anos. Esqueça as bases enevoadas de Geidi Primes (2010), as quebras bruscas e experimentos deHalfaxa (2010) e, principalmente, todo o cardápio de melodias cósmicas detalhadas em Visions. Da abertura ao fechamento do álbum, Grimes brinca com o pop em uma estrutura essencialmente particular. []

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#05. Alabama Shakes
Sound & Color (2015, ATO)
Total: 57 pontos**

Quando foi a última vez que você se emocionou com um disco de rock? Se a resposta for “há muito tempo”,Sound & Color (2014, ATO), segundo e mais recente álbum de estúdio do Alabama Shakes, talvez seja capaz mudar esse resultado. Fuga do imediatismo quase enérgico testado em Boys & Girls, de 2012, Brittany Howard, Zac Cockrell, Heath Fogg e Steve Johnson encontram no novo registro de inéditas mais do que um aprofundamento do próprio universo de referências, mas uma completa desconstrução e particular montagem de diferentes gêneros lançadas em mais de cinco décadas de produção musical. Blues, Soul, Indie, Country, Gospel e Garage Rock, não importa o estilo, cena ou caminho percorrido pelo quarteto ao longo do disco – o resultado final será comovente, único. Verdadeira prova de conceitos, cada faixa do álbum parece apagar qualquer traço de previsibilidade talvez anunciada dentro da estrutura montada para o debut de 2012, revelando mesmo em gêneros tão desgastados, como o “rock clássico”, uma série de passagens antes ocultas. Mais do que flertar com as décadas de 1950, 1960 ou 1970, emSound & Color o grupo de Athens define a própria identidade. []

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#04. Björk
Vulnuicura (2015, One Little Indian)
Total: 61 pontos

O sofrimento sempre esteve diluído em cada novo registro de Björk. Seja de forma maquiada, dentro dos limites anárquicos do KUKL, ou de maneira explícita, na melancolia confessional deUnravel e All Is Full Of Love, mergulhar nos trabalhos da artista islandesa é o mesmo que sufocar em meio a tormentos sentimentais tão centrados na vida da compositora, como íntimos do próprio ouvinte. Todavia, mesmo a completa previsibilidade dos atos e emoções parece corrompida ao esbarrar nos versos amargos de Vulnicura (2014, One Little Indian). Uma peça ainda marcada pelo mesmo caráter conceitual/temático dos grandes álbuns de Björk, porém, tão honesta e liricamente explícita, que mais parece uma curva isolada dentro da trajetória da cantora. Como um espinho doloroso, incômodo e que precisa ser arrancado, o nono álbum de estúdio de Björk foi posto para fora em pouquíssimos meses. Do anúncio (não oficial), em setembro de 2014, até o lançamento da obra, em janeiro de 2015 – forçado pelo vazamento precoce do trabalho na internet -, foram pouco mais de quatro meses, um prazo curto dentro dos padrões da cantora – em extensa turnê desde o álbum Biophilia, em 2011. O motivo de tamanha urgência? A separação de Björk e Matthew Barney, parceiro da cantora na última década e o principal tempero para a matéria-prima que explode em soluços angustiados por todo o registro. []

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#03. Sufjan Stevens
Carrie & Lowell (2015, Asthmatic Kitty)
Total: 76 pontos

Sufjan Stevens sempre me pareceu um grande contador de histórias. Por trás do inofensivo dedilhado de violão lançado pelo artista de Michigan, uma tapeçaria imensa de personagens, recortes fictícios, acontecimentos políticos que marcaram a história norte-americana ou mesmo contos transformados em música doces e envolventes. Basta voltar os ouvidos para o clássicoIllinois, de 2005, onde a vida do palhaço/assassino serial John Wayne Gacy, Jr. foi explorada com sensibilidade única, constante temática na obra do músico, um habilidoso artesão no controle dos sentimentos, capaz de converter detalhes (e temas) tão particulares, em peças facilmente absorvidas por qualquer ouvinte. Mas e as histórias do próprio Stevens, suas angústias, medos e desilusões: onde elas estão? Ainda que tenha atravessado os últimos 15 anos em meio a delicadas confissões românticas, tormentos e temas cotidianos, poucas vezes o universo particular do cantor estadunidense foi apresentado com tamanha clareza e sensibilidade quanto em Carrie & Lowell. Sétimo trabalho de inéditas do artista, o álbum vai além de um regresso aos planos acústicos que lançaram o instrumentista no começo dos anos 2000, revelando um mergulho soturno na conturbada estrutura familiar do cantor – a base temática que se espalha em cada faixa do registro. []

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#02. Tame Impala
Currents (2015, Modular / Interscope)
Total:

Obra de sentimentos, Currents sustenta nos versos uma rara exposição de Kevin Parker. Trata-se do álbum mais intimista, doloroso e, ainda assim, acolhedor já montado pela banda. Canções marcadas por pedidos de desculpas (‘Cause I’m A Man), relacionamentos fracassados (Eventually) e até mesmo versos costurados pelo mais profundo sofrimento (The Less I Know The Better). Uma constante sensação de que todo o arsenal melancólico do álbum anterior – caso deShe Just Won’t Believe Me e Why Won’t They Talk To Me? – “floresceu” dentro do campo fértil de sintetizadores que se espalha do primeiro ao último instante da obra. Próximo e ao mesmo tempo distante da sonoridade incorporada até o último disco, Currents sustenta durante toda a execução pequenas pontes instrumentais para o álbum de 2012. É o caso de Disciples, uma rápida passagem pelo mesmo rock psicodélico (e nostálgico) das primeiras canções da banda. E o que dizer de The Less I Know The Better, composição que poderia facilmente ser encontrada dentro do primeiro álbum do grupo. No restante da obra, o completo domínio dos sintetizadores, instrumento que não apenas oculta (temporariamente) as guitarras, como aproxima o grupo de todo um novo mundo de possibilidades eletrônicas (Let It Happen), além de diálogos com a música pop (The Moment) e até Hip-Hop (Past Life). []

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#01. Kendrick Lamar
To Pimp a Butterfly (2015, Interscope / Aftermath / Top Dawg)
Total: 170 pontos

Kunta Kinte, Wesley Snipes, escravidão, capitalismo, apropriação de cultura, preconceito racial e morte. Antes mesmo que a quarta faixa de To Pimp a Butterfly chegue ao final, Kendrick Lamar assume com o novo álbum de estúdio – o segundo sob o aval de uma grande gravadora, a Interscope -, um dos retratos mais honestos sobre o conceito de “dois pesos, duas medidas” que sufoca a comunidade negra dos Estados Unidos. Uma interpretação amarga, ainda que irônica, capaz de ultrapassar o território autoral do rapper de forma a colidir com o universo de Tupac Shakur, Michael Jackson, Alex Haley e outros “personagens” negros da cultura norte-americana. Como explícito desde o último trabalho do rapper, o bem-sucedido good kid, m.A.A.d city (2012),To Pimp a Butterfly está longe de ser absorvido de forma imediata, em uma rápida audição. Trata-se de uma obra feita para ser degustada lentamente, talvez explorada, como um imenso jogo de referências e interpretações abertas ao ouvinte. Da inicial citação ao ator Wesley Snipes – preso entre 2010 e 2013 por conta de uma denúncia de fraude fiscal -, passando por referências ao cantor Michael Jackson, Malcom X, Nelson Mandela, exaltações à comunidade negra, além de trechos da obra do escritor Alex Haley –  Negras Raízes (1976) -, cada faixa se espalha em um acervo (quase) ilimitado de pistas, costurando décadas de segregação racial dentro e fora dos Estados Unidos.

Não por acaso a “estrutura narrativa” do álbum segue de forma distinta em relação ao trabalho de 2012. Enquanto good kid, m.A.A.d city foi vendido como um “roteiro de cinema” – conceito reforçado na utilização de diálogos e pequenas “cenas” encaixadas no interlúdio de cada composição -, com o novo disco é possível observar a formação de uma pequena base episódica, como um seriado, estrutura arquitetada com naturalidade no decorrer das faixas. São recortes precisos, temas pessoais ou mesmo histórias adaptadas, como se a cada novo capítulo “da série”, Lamar e convidados (como George Clinton, Pharrell Williams e Snoop Dogg) analisassem aspectos distintos de um mesmo universo temático. []

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**Desempate pelo número de indicações em 1º lugar.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.