Pequenos Clássicos Modernos

/ Por: Cleber Facchi 03/01/2012

Cat Power
Indie/Female Vocalists/Folk
http://www.catpowerthegreatest.com/

Por: Cleber Facchi

 

Uma ode à dor e a melancolia, essa parece ser a premissa básica de cada novo álbum lançado pela estadunidense de Atlanta Charlyn Marie Marshall, cantora e compositora que acabou conhecida em meados dos anos 1990 graças a uma série de pequenos projetos semi-caseiros, todos lançados sob o nome de Cat Power. Munida de um simplista jogo de guitarras, violões, pianos e leves camadas de distorção sombria, a musicista foi aos poucos estabelecendo todos os limites daquilo que viria a ser compreendido como sua obra, um enorme e doloroso plano de fundo musical que acabaria servindo como base para alguns dos versos mais sofridos da presente música norte-americana (e mundial).

Se em anos iniciais através de discos como What Would the Community Think (1996) e Dear Sir (1995) Marshall havia agregado relativo destaque, sendo aclamada por algumas publicações e desprezada por outras – talvez um reflexo da constante busca por estabelecer uma sonoridade própria -, a partir do quarto álbum da carreira (o elogiado Moon Pix, de 1998), a musicista havia de fato estabelecido um terreno apenas dela. Sorumbática e muitas vezes ébria, Chan (como é conhecida) parecia aos poucos construir todo um conjunto de versos e sons que seriam posteriormente condensados em uma obra maior.

Essa “obra maior” viria apenas no começo do novo século, quando no ano de 2003 em meio aos ruídos ascendentes das guitarras que honravam o revival pós-punk, Cat Power surgiu minuciosa, munida apenas de pianos melancólicos, guitarras básicas e todo um monumental catálogo de poesias que fariam nascer o sóbrio You Are Free. Amargurado e sufocante desde as primeiras notas que ecoam através de um piano sombrio, o sexto álbum de estúdio da cantora (precedido de um trabalho de versões lançado em março de 2000, The Cover Records) é um mergulho em um mar denso de recordações sofridas. Composições obscuras que ecoavam um passado (na época) ainda recente.

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Madura tanto como compositora como cantora, Marshall passeia ao longo de todo o registro como uma espécie de anti-diva da música folk, se aproximando cada vez mais do Bob Dylan da fase elétrica ou se relacionando intelectualmente com um Bill Callahan dos primeiros trabalhos ao lado do Smog – influência declarada desde os primeiros trabalhos da cantora. Mais do que uma artista clara e ricamente influenciada, a americana abre espaço para apresentar um jogo de características e peculiaridades próprias, algo que as melodias melancolicamente cantaroláveis acabam proporcionando a ela.

Imersa em um coro de overdubs que multiplicam sua voz em cada mínima composição, Chan passeia pelo que parece ser uma solidão interior ampliada, como se os coros de vozes que a acompanham fossem uma espécie de metáfora para as inúmeras figuras solitárias dela mesma (também compartilháveis com as diferentes faces dos ouvintes) e que parecem se encontrar todas no interior do registro. O resultado está em um álbum abrangente, um trabalho que parece a todo o momento salvar a plural figura central da obra, muito embora amores do passado (Good Woman e I Don’t Blame You) e crises pessoais (Speak For Me) acabem sempre puxando a cantora para um mundo de sensações sombrias e dolorosas.

Amplo e contraído na mesma medida, You Are Free conta com pequenos complementos ao longo de sua execução, como a bateria de Dave Grohl e as vozes de apoio de Eddie Vedder em algumas faixas, contribuições que parecem impedir Marshall de promover um registro demasiado sombrio, tornando o trabalho linear até o ecoar dos pianos macambúzios de Evolution. Mesmo doloroso, o álbum parece se anunciar como um grande respiro, como se o “você está livre” que dá título ao trabalho fosse uma espécie de aviso mental feito por Chan Mashall para ela mesma.

You Are Free (2003, Matador)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Feist, Wilco e PJ Harvey
Ouça: I Don’t Blame You
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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.