Pequenos Clássicos Modernos

/ Por: Cleber Facchi 10/01/2012

Girl Talk
Mashup/Electronic/Dance
http://www.myspace.com/girltalk/

 

Por: Cleber Facchi

 

O que caracteriza a propriedade de uma música? Um documento em algum cartório, o fato de alguém ter montado a instrumentação da faixa ou escrito seus versos? Se esses forem os limites ou elementos que caracterizam a posse de um som, então Gregg Gillis parece simplesmente não se importar. Responsável pelo projeto Girl Talk, Gillis vem desde idos dos anos 2000 transformando velhas conhecidas de outros artistas em criações próprias, faixas que rompem com os limites de um mero mashup, se convertendo em músicas inéditas, pontos de convergência para que distintos versos, bases, riffs e todo um vasto número de elementos se traduzam em algo novo, quiçá inédito.

Estudioso dos ensinamentos mestrados por DJ Shadow no clássico Endtroducing… de 1996, o produtor de Pittsburgh, Pennsylvania pareceu nunca se importar em concentrar suas composições em um único período de tempo ou gênero musical, feito que lhe garantiu aproximar veteranos da música pop e do rock com novos nomes do cenário musical. Desde que lançou o primeiro álbum – Secret Diary – em meados de 2002 que Gills vem se revezando em uma sucessão de encaixes certeiros, unindo trabalhos de indivíduos tão distintos que logo se tornam intimamente próximos através de suas criações.

Se ao apresentar Night Ripper em 2006 o produtor havia ampliado de forma considerável todo o leque de possibilidades proposto em sua música, cruzando cada vez mais referências em uma única composição, com o lançamento seguinte, Feed The Animals (2008), Girl Talk alcançaria o ápice. Em pouco mais de 50 minutos, o registro – partilhado em 14 faixas – passearia através de uma imensa discografia, experimentando doses imoderadas de hip-hop (uma das maiores paixões de Gills), o pop de Avril Lavigne e Kelly Clarkson, até o rock conceitual do Radiohead da fase In Rainbows.

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Cada composição presente no registro apropria-se de pelo menos de dez outras canções, algumas como What It’s All About ultrapassam essa marca, incorporando exatas 35 músicas dentro de “curtos” 4:15 minutos. Em Here’s the Thing, por exemplo, antes que os refrões fáceis de Since U Been Gone explodam aos 1:44 da canção, Gills já havia passado por Time of the Season do The Zombies e Saturday in the Park do grupo veterano Chicago, apenas uma prévia do que viria com a explosão de Song 2 do Blur, Pump It Up do Elvis Costello ou Kiss Kiss do Chris Brown – faixas que não mais pertenciam a seus antigos “donos”.

Feito um enorme cardápio musical, apresentando diferentes alimentos para distintas espécies de animais (ou ouvintes), Feed The Animals passeia constantemente entre o nostálgico e o recente, com Gills resgatando composições muitas vezes esquecidas para junto pérolas recentes da música pop. Dessa forma, é totalmente natural ouvir Avril Lavigne cantando a pegajosa Girlfriend ao lado de Rod Stewart, que ecoa trechos de Young Turks, um processo tão natural quanto observar Rihanna e Queen ou Aerosmith e Radiohead partilhando de um mesmo espaço sonoro. Tudo produzido de maneira não preconceituosa e simplesmente natural.

Inicialmente comercializado dentro da mesma estratégia proposta pelo Radiohead no disco In Rainbows (2007) – “pague o quanto você achar que vale o álbum” -, o quarto registro do Girl Talk parece em todos os aspectos romper com a linearidade da música convencional e seus métodos de consumo, resultado natural da mente anárquica de Gills – no documentário RiP!: A Remix Manifesto é possível ter uma ótima noção de como funciona o pensamento do produtor. Feed The Animals é uma enorme salada musical, feita para alimentar tanto as espécies mais raivosas como as ponderadas.

Feed The Animals (2008, Illegal Art)

Nota: 8.5
Para quem gosta de: E-603, João Brasil e The Hood Internet
Ouça: Here’s the Thing e Hands In The Air
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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.