Pequenos Clássicos Modernos

/ Por: Cleber Facchi 09/05/2011

Wado
Brazilian/Alternative/Experimental
http://www.myspace.com/wwwado
http://www2.uol.com.br/wado/

Por: Cleber Facchi

Atlântico Negro (2009), quinto disco de estúdio do catarinense naturalizado em Alagoas Wado tinha tudo para não dar certo, afinal, um ano antes, o músico já havia dado origem àquela que seria sua obra-prima, o conceitual Terceiro Mundo Festivo (2008). A maneira cuidadosa com que o compositor entrelaçava afoxés, funks e elementos do rock alternativo deixam a entender que seriam necessários mais alguns anos de experimentações até um aceitável novo álbum. Ledo engano. Em meio a reinventos de sua própria sonoridade, o álbum releva um artista ainda mais evoluído e surpreendentemente criativo.

Enquanto o trabalho anterior subdividia as composições mais acessíveis do músico em pontos estratégicos do trabalho, o novo álbum se transforma em um grande concentrado de hits fáceis e meticulosamente encaixados na mesma sonorização regional de antes, agora, porém, de maneira melhor resolvida e instrumentalmente melhor conduzido. Entre sambas, axés, raps, afoxés, funks e experimentalismos suaves, Wado deixa sua voz macia conduzir o ouvinte em meio à reflexões históricas, existenciais e contemporâneas, sem nunca naufragar no melancólico.

Os referenciais ligados à cultura africana são os elementos que conduzem o trabalho como um todo, sendo encontrados da capa do disco à sua musicalidade, fervilhando sons, texturas, tons e ritmos, todos originários das terras além mar. Menos acoplado de ritmos eletrônicos e programações sintéticas – algo que tomava de sobressalto o álbum anterior – Atlântico Negro transpira um resultado totalmente orgânico, tanto na aplicação instrumental (conduzida por Bruno Rodrigues, Dinho Zampier, Pedro Ivo e Rodrigo Peixe) quanto nos vocais, onde os pequenos coros transferem ao registro um caráter de coletividade.

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O composto da cultura africana vem inserido também nos versos do trabalho, que logo em seu inicio, através da faixa Estrada, abre espaço para que um estudante de Guiné-Bissau (país situado na costa-oeste da Africa) declame trechos carregados de referencial. Jejum/Cavaleiro de Aruanda e Martelo de Ogum (com letra inspirada no disco Made In The Dark do Hot Chip) são outras duas canções que entrelaçam toques da cultura africana com a brasileira, circundando o religioso e o regional.

Entretanto, o disco permite que Wado se afunde em letras variadas, separando-se momentaneamente da proposta inicial do álbum. Entre os agradáveis distanciamentos estão Hercílio Luz (feita à quatro mãos com o escritor moçambicano Mia Couto), a declarada Frágil (estranhamente parecida com Melhor, do disco anterior, embora menos colorida) e a surpreendente Pavão Macaco, dona de uma melodia cuidadosa e uma letra que passa pelo nonsense e pelo fantástico.

Assim como são múltiplos os mares navegados por Wado ao longo de Atlântico Negro, muitos são seus companheiros no decorrer dessa viagem. Há desde Romulo Fróes, Curumin, a violoncelista Miran Abs, João Paulo Guimarães (Mopho), além da caprichada produção e mixagem de Kassin, dando suporte e estabilidade ao registro do cantor, que aqui se porta como o grande capitão de sua tripulação.

Atlântico Negro (2009)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Fino Coletivo, Momo e Bruno Morais
Ouça: Pavão Macaco

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.