Praia, Sol e o verão sem fim da música alternativa

/ Por: Cleber Facchi 04/06/2011


Por: Cleber Facchi

Embora dure aproximadamente três meses, a sensação é a de que o verão anda com seus limites ampliados, passando de 90 para 365 dias por ano. Não pelo aumento da temperatura em vista do desgaste da camada de ozônio, mas pela “onda” de bandas e artistas, tanto gringos quanto nacionais, que tem feito com que o clima quente e as sonorizações ensolaradas durem o ano inteiro. Roupas floridas, calção de banho, biquíni, óculos de sol e não se esqueçam: “use filtro solar”.

Observando com cuidado o tal “verão” que toma conta não só das praias, como dos tocadores de MP3 e players de áudio em geral teve seu início lá em 2009, quando uma sucessão de artistas, em sua maioria californianos (honrando suas descendências sessentistas, de quando o The Beach Boys dava conta do gênero) deram provas de que música e praia são duas misturas mais do que coerentes e atuais. Surgem, então, nomes como Christopher Owens, vocalista e criador do Girls, que naquele ano presenteou o público com o chapado lançamento do disco Álbum, de onde despontavam faixas como Lust For Life, Laura e Hellhole Ratrace. Na mesma linha vinha ainda o Real Estate, estreando seu autointitulado disco de estúdio, envergando, porém, para um seguimento muito mais psicodélico e que se dissolvia na produção de composições lo-fi e levemente ruidosas.

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Não apenas o rock ganhava seus contornos praieiros, mas a música eletrônica também, afinal surgia ali o que mais tarde se transformaria em uma pequena “praga” no meio musical: a Chillwave. Batidas assíncronas, sobreposições de texturas ruidosas e uma leve sensação de preguiça era emanadas através das canções de gente como Neon Indian, Memory Tapes e Washed Out. A forma “empoeirada” com que as faixas chegam até os ouvidos exprimem uma sensação nostálgica, parte pelas pequenas referências aos anos 80, um tipo de homenagem tardia, como fica visível em discos como Psychic Chasms do Neon Indian.

Veio 2010 e o Sol ainda brilhando forte fez com que mais uma boa leva de músicos nos presenteasse com uma sequência de ótimos lançamentos. No campo do rock, Bethany Cosentino e o parceiro Bobb Bruno do Best Coast deram todo aquele clima de “um amor de verão” ao soltarem o romântico Crazy For You. Autoproclamado “Rei da Praia”, Nathan Williams e seu Wavves (que até então seguiam em uma temática voltada ao skate music) mostraram que o clima à beira mar é também motivo para uma rajada de guitarras sujas e muita, muita lisergia. Teve até quem tentou dar um toque “cult” a isso, como o belo resultado de Big Echo, segundo disco de estúdio do The Morning Benders.

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Ao mesmo tempo em que o clima ensolarado fez bem para um sem número de trabalhos, o excesso de luminosidade trouxe alguns focos de insolação ao longo de todo o ano. Prova disso é o enfadonho surto de artistas entregues à Chillwave, ou seus diversos subgêneros, como glo-fi, shitwave, hypnagogic pop e segue a (gigantesca) lista. Claro que Toro Y Moi, How To Dress Well e alguns outros passaram longe de cometer os mesmos erros. Vieram também os artistas genéricos, sendo que para cada grande nome surgiam cópias exatamente iguais, tocando de forma idêntica e tratando dos exatos mesmos temas.

Apesar de que o foco seja outro, no Brasil alguns artistas acabaram tocados pelos mesmos raios de criatividade (mesmo que de maneira involuntária), dando forma a um som nem tão praieiro, mas tão quente quanto o que é tocado lá fora. Se no exterior era a temática “surf” que predominava, em terras tupiniquins é o Axé Music que voltava com tudo. O “grande vilão” da música brasileira – que ganhou vida no fim dos anos 80 e explodiu na década seguinte graças a uma série de artistas – fica mais do que visível nos trabalhos de estreia tanto da paulistana Holger, como da carioca Do Amor. Já as reverberações lo-fi tornam-se perceptíveis no recente single dos também paulistas do Dorgas, o ainda fresco Loxhanxha, embora acabem (felizmente) dando formas a um som que bebe do jazz, esparsos toques de shoegaze e experimentalismos bem inclusos.

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Em pouco mais de dois anos de temperaturas altas, areia escaldante, cheiro de protetor solar e uma série de bons lançamentos – alguns enaltecidos até demais – não seria ruim se uma frente fria viesse para dar uma boa refrescada. Talvez o excesso de Sol já não esteja fazendo tão bem quanto parecia há algum tempo.

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Texto originalmente publicado na Freak! mag edição 2. Leia esta e outras matérias aqui.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.