Resenha: “Haicu”, Haicu

/ Por: Cleber Facchi 11/08/2016

Artista: Haicu
Gênero: Indie, Alternative, Experimental
Acesse: https://soundcloud.com/haicuduo

 

Vozes delicadas, arranjos contidos e versos marcados em essência pela angústia. Assim pode ser resumido o trabalho produzido pela dupla Pedrinhu Junqueira e Júlia Shimura dentro do primeiro álbum de estúdio como Haicu. Fruto de uma coleção de versos e experimentos musicais desenvolvidos pelo casal durante o intervalo de um ano, o registro de 13 composições inéditas parece crescer sem pressa, orgânico, detalhando cenas, desejos e acontecimentos corrompidos pelos sentimentos.

Inspirado pela poesia japonesa — os “haikais” como são conhecidos no Brasil —, o trabalho de rimas simples se projeta em meio a vozes cíclicas, ora intimistas, ora desorientadas, como fragmentos espalhados de forma propositadamente inexata pelo interior do disco. Sussurros românticos (“Não sei mais dizer se é fio do meu / se é fio do seu cabelo grudado no azuleio”) e melancólicos (“nada vai ser igual sem o seu Carnaval”) que cercam, provocam e acolhem o ouvinte.

Entre poemas que amarram versos em português, inglês e japonês, Junqueira e Shimura acabam detalhando a construção de um cenário urbano, atual. São histórias de amor (Never Die), relatos de abandono (Fall) e até confissões que parecem surgir do cotidiano do próprio casal (Amor). Da abertura ao fechamento do disco, um delicado ziguezaguear de inspirações que dialoga de forma natural com a sonoridade versátil do disco, curiosa e parcialmente inédita a cada nova composição.

Ainda que as inaugurais Leve e Nada Vai indiquem a predileção da dupla pela Bossa Nova, conceito explícito no movimento tímido dos arranjos e vozes, à medida que o disco se expande, crescem as possibilidades e sons incorporados pelo casal. Composições que flertam com a Tropicália – principalmente os trabalhos em parceria entre Caetano Veloso e Gal Costa –, atravessam a década de 1970 e alcançam o presente cenário corroídas por instantes breves de experimento.

Tal qual a tapeçaria lírica que se espalha pelo disco, Junqueira e Shimura brincam com as possibilidades. O rock pendendo para o blues em Fall, contornos melódicos em Fudeu, a psicodelia que se espalha deliciosamente em O Fogo Vai Subir. Longe do óbvio, ruídos explodem a todo o instante, maquiando as vozes do casal com pequenas distorções, proposta que muito se assemelha ao som produzido pelos conterrâneos do Letuce nos dois últimos trabalhos de estúdio – Manja Perene (2012) e Estilhaça (2015).

Parte dessa sonoridade diversa que orienta a obra vem da precisa interferência dos músicos Gabriel Ballesté, Pedro Dantas, Thomas Harres, Mauricio Calmon e Antonio Neves. Um time de instrumentistas que auxilia o casal a expandir ainda mais o rico labirinto de ideias, sons, versos, ritmos e experiências que se cruzam no interior do álbum. Um trabalho que cresce sereno, mas se revela imenso, curioso e torto a cada nova audição.

 

Haicu  (2016, Independente)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Letuce, Tono e Ava Rocha
Ouça: Nem Vem, Amor e Fudeu

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.