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Críticas

Cordel do Fogo Encantado

: "Viagem ao Coração do Sol"

Ano: 2018

Selo: Independente

Gênero: MPB, Alternativa

Para quem gosta de: Cidadão Instigado, Otto e Eddie

Ouça: Eternal Viagem e Destilações

8.5
8.5

Resenha: “Viagem ao Coração do Sol”, Cordel do Fogo Encantado

Ano: 2018

Selo: Independente

Gênero: MPB, Alternativa

Para quem gosta de: Cidadão Instigado, Otto e Eddie

Ouça: Eternal Viagem e Destilações

/ Por: Cleber Facchi 16/04/2018

Liberdade é palavra de ordem em Viagem ao Coração do Sol (2018, Independente). Primeiro álbum de inéditas do grupo pernambucano Cordel do Fogo Encantado em 12 anos, o sucessor do maduro Transfiguração (2006) mostra o esforço da banda formada por Clayton Barros (violão e voz), Emerson Calado (percussão e voz), Nego Henrique (percussão e voz) e Rafa Almeida (percussão e voz) e José Paes de Lira (voz) em se reorganizar e, ao mesmo tempo, romper com os próprios limites dentro de estúdio. Um permanente desvendar da própria identidade artística e poesia que vem sendo explorada desde o homônimo debute do quinteto, lançado em 2001.

O sonho acabou / E só assim saímos do fundo da terra em direção ao Sol / O mundo agora é esse: Precisamos falar com a filha do vento / A que chamam / Liberdade“, declama o vocalista Lirinha logo nos primeiros segundos do disco, apontando a direção seguida pelo grupo no restante da obra. Morte e ressurreição, fim e recomeço. Um olhar para o passado, mas que em nenhum momento se distancia do presente, como se os cinco integrantes da banda seguissem exatamente de onde pararam há oito anos, quando silenciaram temporariamente o trabalho do grupo para investir em outros projetos.

Entre versos declamados e o canto forte, Viagem ao Coração do Sol traz de volta o mesmo conceito teatral aprimorado em O palhaço do circo sem futuro (2002), porém, dentro de uma nova estrutura. Perfeita representação desse resultado está no minimalismo curioso que invade No Compasso da Mãe Natureza ou o Amor, a Pureza e a Verdade, uma parcial fuga do som eufórico que abre o disco, em Sideral ou Quem Ama Não Vê Fim. Temas percussivos, guitarras e vozes espalhados sem pressa, estrutura que se repete na melódica Pra Cima Deles, Passarinho ou Semente Brilhante, composição em que aflora a poesia política, ainda que metafórica, de Lirinha – “Pedra lançada / Na terra das cercas de arame / Sua dor é também dor do mundo / Semente brilhante no ar“.

Parte dessa transformação nasce da forte interferência de Fernando Catatau como produtor do disco. Difícil ouvir a romântica Destilações, composta por Maviael Melo e Alisson Menezes, e não perceber nos sintetizadores e melodias acústica a mesma atmosfera “brega” que marca o trabalho do músico cearense no Cidadão Instigado. Um som empoeirado, nostálgico, como um precioso diálogo da banda com o pop rock dos anos 1970 e 1980. Instantes de profunda liberdade criativa e ruptura, mas que em nenhum momento perverte a essência do grupo pernambucano.

Exemplo disso está em Eternal Viagem, encontro musical de Lirinha com a atriz e poetisa Nataly Rocha. De essência romântica, a faixa não apenas reflete a nova estrutura musical adotada pela banda, como resgata a mesma poesia detalhista que há mais de duas décadas serve de estímulo ao material produzido pelo quinteto. “Todo dia o Sol mata a madrugada / Toda tarde vai preso novamente / Você sabe o caminho, você me espera? / Andar no mundo não há mais segredo / Vamos, ainda não acabou“, entrega a letra da canção, recheada pela inserção de elementos da natureza, sussurros românticos e delírios poéticos.

Maior a cada nova audição, Viagem ao Coração do Sol mostra um grupo seguro, demonstrando pleno domínio da própria obra. Entre composições grandiosas, íntimas dos primeiros registros em estúdio – como Liberdade, A Filha do Vento, Conceição ou do Tambor Que Se Chama Esperança e Raiar ou o Vingador da Solidão –, e atos de parcial recolhimento – como em Primeira Paisagem ou a Flor Molhada –, cada fragmento do disco serve de passagem para um ambiente mágico. Canções de essência escapista, talvez distantes do atual cenário político/cultural brasileiro, porém, envolventes e ritualísticas, como um convite a se perder em um universo próprio da banda.

 

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.