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Críticas

Lupe de Lupe

: "Vocação"

Ano: 2018

Selo: Balaclava Records / Geração Perdida

Gênero: Rock, Rock Alternativo

Para quem gosta de: El Toro Fuerte e Ventre

Ouça: Frágua, Lâmina Cega e Midas

8.5
8.5

Resenha: “Vocação”, Lupe de Lupe

Ano: 2018

Selo: Balaclava Records / Geração Perdida

Gênero: Rock, Rock Alternativo

Para quem gosta de: El Toro Fuerte e Ventre

Ouça: Frágua, Lâmina Cega e Midas

/ Por: Cleber Facchi 26/11/2018

Infelizmente, infelizmente / Não é possível resolver os problemas do país com uma música“. O verso sóbrio que ganha forma no interior da verborrágica O Brasil Quer Mais, quinta faixa de Vocação (2018, Balaclava Records / Geração Perdida), diz muito sobre a atmosfera pessimista que orienta a experiência do ouvinte durante toda a execução do quarto álbum de estúdio da Lupe de Lupe. Primeiro registro de inéditas do quarteto mineiro desde o excelente Quarup (2014), o trabalho de dez faixas segue exatamente de onde o grupo parou há quatro anos. Frações instrumentais e poéticas que se espalham em meio a delírios existencialistas, conflitos políticos e tormentos pessoais

Catapultado pela força criativa e crueza que invade a crescente Frágua, faixa de abertura do disco e uma das melhores composições do grupo mineiro, Vocação parece seguir o fluxo incerto de uma corredeira. São ideias e fragmentos poéticos arremessados sem ordem aparente, como um convite a se perder pela mente insana de cada integrante da banda — hoje composta pelos músicos Cícero Nogueira (bateria e voz), Gustavo Scholz (guitarra e voz), Renan Benini (guitarra e voz) e Vitor Brauer (baixo e voz).

Exemplo disso ecoa com naturalidade na turbulenta Midas. São pouco mais de oito minutos em que guitarras colossais, quebras e versos declamados ganham forma em um ambiente claustrofóbico, por vezes opressor. “Pois o Deus que nos fala, por lei, na Bíblia Sagrada, não matarás / É o mesmo Deus que permite a arma, a violência, a insanidade, a segregação, o estupro, o abandono e a absolvição de Barrabás“, cresce a provocativa letra da canção. Versos ásperos, longe de qualquer traço de polidez, como se do material apresentado durante o lançamento de Quarup, o quarteto mineiro fosse além, brincando com a permanente desconstrução das melodias e vozes.

A mesma força turbulenta acaba se refletindo na composição de músicas como a intensa Voz, e, principalmente, a já citada o Brasil Quer Mais, instante de forte desequilíbrio em que Brauer parece replicar a mesma atmosfera de faixas como Eu Já Venci, porém, acaba esbarrando em um texto arrastado e pobre de Facebook. Mesmo quando se distancia desse resultado catártico, como na densa Terra, uma melancólica reflexão sobre a morte, interessante perceber a completa entrega de cada integrante da banda. Camadas de ruídos e vozes que arrastam o ouvinte para dentro de um imenso turbilhão emocional, conceito que vem sendo aprimorado (ou distorcido) pela banda desde amadurecer criativo em Sal Grosso (2012).

Dos poucos momentos em que se permite respirar, Vocação revela ao público algumas das composições mais sensíveis já produzidas pela Lupe de Lupe. Fragmentos isolados, como a caseira Anjo, ou mesmo as guitarras melódicas que sutilmente abrem o disco em Frágua. A própria faixa de encerramento do trabalho, Lâmina Cega, bem-sucedido encontro com a cantora e compositora Bruna Mendez, parece distanciar o ouvinte do núcleo instável da obra. “Mas não perca a esperança / O inimigo pode até te matar / Mas a vida te deu muita força / Pra lutar … E no fim vai vencer, vai vencer / A espada que luta contra o mal morre com a lâmina cega“, canta em um ato de pura resistência, porém, preservando a base contida que se revela ao público logo nas primeiras notas.

No restante da obra, o mais profundo caos. São guitarras carregadas de efeitos, vozes berradas e paredões de ruídos, em Álamo; na melancolia inquietante de Vejo Uma Lua No Céu, uma herança clara da obra de Jair Naves na extinta Ludovic; em Esqueletos, versos semi-declamados que se espalham em uma cama de melodias sujas, sufocantes. Pequenas corrupções estéticas que tornam a experiência do ouvinte imprevisível durante toda a execução do trabalho, como uma extensão brutal de tudo aquilo que o quarteto havia testado durante o lançamento de Quarup.

 

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.