Image

Ano: 2021

Selo: Polyvinyl

Gênero: Indie, Pop Rock, Samba

Para quem gosta de: Marcelo Camelo e Little Joy

Ouça: Maré, Tango e The End

7.7
7.7

Rodrigo Amarante: “Drama”

Ano: 2021

Selo: Polyvinyl

Gênero: Indie, Pop Rock, Samba

Para quem gosta de: Marcelo Camelo e Little Joy

Ouça: Maré, Tango e The End

/ Por: Cleber Facchi 27/07/2021

Drama (2021, Polyvinyl), como o próprio título aponta, é um trabalho de sentimentos bastante ressaltados. Dor, saudade, carinho, alegria e melancolia. São fragmentos emocionais e poéticos que se espalham em meio a memórias de um passado ainda recente e experiências vividas pelo cantor e compositor Rodrigo Amarante no isolamento da própria casa, na cidade de Los Angeles, na Califórnia. Um precioso exercício criativo que preserva a identidade autoral do músico carioca, principalmente quando voltamos os ouvidos para o único exemplar da parceria com Binki Shapiro e Fabrizio Moretti, no Little Joy, porém, segue o caminho oposto ao material entregue no registro que o antecede, o hermético Cavalo (2013), de onde vieram composições como as misteriosas Irene e O Cometa.

E isso fica bastante evidente logo na sequência de abertura do trabalho. Passada a introdutória faixa-título, onde risos contrastam com a melancólica orquestração dos arranjos, melodias assobiáveis e a percussão quente de Maré refletem a capacidade de Amarante em se comunicar com o ouvinte por meio das emoções. “Eu sei, sorte é não querer mais que viver / É ter amor pra dar / Quem não tem?“, canta em meio a versos sorridentes. Mesmo quando desacelera, na canção seguinte, Tango, o músico fluminense parece estreitar a relação com público, investindo na construção de um material de linguagem universal. “Em seus olhos eu vejo, está na minha cabeça / Se chegar a hora, você pula / E nos tornamos um“, detalha em meio a vozes enevoadas que destacam a presença de Cornelia Murr, colaboradora em diversas composições ao longo da obra, como nos teclados de I Can’t Wait.

Nesse sentido, Drama nasce como uma soma de tudo aquilo que Amarante tem incorporado desde o hiato por tempo indeterminado que os integrantes do Los Hermanos anunciaram há mais de uma década. São canções de essência litorânea que estreitam a relação com diferentes colaboradores, como Moreno Veloso e o percussionista Daniel Castanheira, transitam por entre ritmos e abordagens criativas de forma sempre delicada. E isso fica bem representado na derradeira The End, música que parte de uma base econômica de pianos entristecidos, íntimos das canções apresentadas em Cavalo, porém, cresce para além dos limites da obra, incorporando a percussão detalhista e harmonias de vozes que apontam para o mesmo território explorado com os parceiros do Little Joy.

Claro que isso não impede Amarante de buscar por novas possibilidades ao longo do trabalho. Exemplo disso acontece na doce nostalgia de Tara. Enquanto arranjos econômicos e a voz manhosa evocam para a obra de João Gilberto, naipes de metais e harmonias sobrepostas transportam a obra do cantor para um novo território criativo. É como se o músico fosse de encontro ao período como colaborador da Orquestra Imperial, porém, livre da essência carnavalesca que embala o festivo Carnaval Só Ano Que Vem (2007). O mesmo olhar curioso para o passado acaba se refletindo em Eu Com Você, composição que esbarra na ambientação torta de Cavalo, mas se permite ir além, incorporando uma série de novos elementos e componentes rítmicos que ampliam os limites da obra.

O problema é que muitas dessas canções, mesmo utilizando de abordagens pouco usuais, partem de uma base instrumental e rítmica bastante similar. Do andamento dado à bateria e temas percussivos em Maré, Tanto e Eu Com Você, aos arranjos incorporados nos momentos de maior melancolia, como em Tango e I Can’t Wait, Amarante parece dar voltas em torno de um previsível conjunto de ideias, fazendo dessa repetição um evidente elemento de desgaste, principalmente na segunda metade do trabalho, quando a forte similaridade entre as faixas torna a audição arrastada. São raros os momentos em que compositor rompe totalmente com essa estrutura, como Sky Beneath, música que encanta pelo contraste entre a percussão de Castanheira as cordas de Danny Bensi.

Entretanto, assim como em Cavalo, Amarante sabe exatamente como capturar a atenção mesmo nos momentos de maior instabilidade do registro. São melodias cíclicas, fragmentos de vozes, texturas e assobios que continuam a ecoar na cabeça do ouvinte mesmo após o encerramento do trabalho. Um minucioso jogo de palavras que parte de experiências sentimentais vividas pelo compositor carioca, mas que em nenhum momento deixam de dialogar com o público. Canções que encolhem e crescem a todo instante, trilham caminhos irregulares e ainda revelam diferentes camadas a cada nova audição. A própria imagem de capa do disco, uma criação abstrata do artista plástico Hernan Paganini, parece contribuir para esse resultado, reforçando a sensação de obra viva, sempre mutável.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.